Há 12 anos, o povo Guarasugwe luta pela demarcação da área ocupado por eles. Para lideranças, a morosidade no processo de demarcação contribui para violências. Há mais de 10 anos, indígenas da etnia Guarasugwe aguardam a demarcação do território tradicionalmente ocupado pelo seu povo, nas proximidades de Pimenteiras do Oeste (RO). O caso ganhou destaque esta semana, depois que um jovem Guarasugwe foi atacado com golpes de remo na cabeça, enquanto pescava no rio Guaporé.
“Na década de 60, muitos povos foram mortos e muitos tiveram que sair do seu território para manter a vida. Isso ocorreu com o povo Guarasugwe. É um processo muito longo de genocídio com meu povo. Os Guarasugwe tiveram um apagamento durante todo esse tempo, porque o estado brasileiro colocou como se esse povo não existisse mais”.
A fala acima é de Rosa Maria Guarasugwe, uma das lideranças de seu povo. Para ela, a demora na demarcação do território contribui para as violências frequentes - sejam elas físicas ou morais - à que o povo Guarasugwe é exposto.
“Nós já estamos nisso [processo de demarcação] há 12 anos e não foi montado nem um grupo de estudo para que desse início ao processo de demarcação. O território do povo - onde estão enterrados nossos parentes, nossas raízes, nossos ancestrais - está na mão de invasores”.
O território do povo Guarasugwe é o Yakarerupa. São cerca de 600 indígenas da etnia espalhados por Rondônia e Bolívia, já que se trata de um povo transfronteiriço.
“A luta pela demarcação do território é para que o nosso povo viva em paz. Para que o nosso povo manifeste sua cultura à presente e futura geração. Para que a nossa família volte a viver onde era dela, onde é nosso. Que os nossos anciãos consigam pisar novamente no solo sagrado”, explica Rosa.
Ação do MPF
Fachada do Ministério Público Federal em Rondônia
MPF/Divulgação
O processo de demarcação do território tradicional do povo Guarasugwe é acompanhado de perto pelo Ministério Público Federal (MPF). Em 2022, o órgão ingressou com uma ação contra a União e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), pedindo a identificação e delimitação da área.
“É de fácil percepção que a ausência de um reconhecimento formal da etnia Guarasugwe somada à falta de demarcação do seu território tradicional Yakarerupa tem implicado no tolhimento de diversos direitos fundamentais que são inerentes aos indígenas, dentre eles o direito de ter acesso a medidas sanitárias que lhe sejam adequadas enquanto indígenas”, aponta o MPF na ação.
A citação pode ser complementada por exemplos dados por Rosa Maria: “O direito básico que era certidão de nascimento, muitos dos nossos parentes não tinham. Para a sociedade, um indígena tem que estar ligado ao território, para as políticas públicas aconteceram. E como isso vai acontecer se não tem a demarcação do território?”.
De acordo com o procurador da República Leonardo Caberlon, o processo de demarcação do território Yakarerupa está na fase de réplica: o MPF deve se manifestar em relação às contestações apresentadas pela União e Funai.
“As contestações foram apresentadas em 2022 e ambas pedem que o pedido do MPF seja julgado improcedente”, afirma o procurador.
O g1 entrou em contato com a União e a Funai, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Casos de violências
Durante o fim de semana, um indígena da etnia Guarasugwe foi atacado com golpes de remo na cabeça enquanto pescava no rio Guaporé, em Pimenteiras do Oeste.
Segundo denúncia feita pela comunidade indígena, o agressor proferiu xingamentos racistas e xenofóbicos, ameaçou a vítima de morte e a atacou pelas costas, mesmo que não houvesse qualquer reação aos insultos.
Indígena é atacado com golpes de remo na cabeça em Rondônia.
Divulgação
“É mais um caso de negação de direito. De um povo indígena não poder andar no espaço que é seu de direito. É um ato de covardia, pela sociedade não indígena”, denuncia Rosa Maria.
O Ministério Público Federal (MPF) informou que recebeu uma denúncia sobre o caso e deve abrir uma investigação. O órgão ressalta ainda que não é a primeira vez que recebe relatos de crimes contra a comunidade indígena.
No fim de 2022, a comunidade denunciou preconceito e discriminação sofridos por alunos e professores da etnia Guarasugwe, em uma escola de Pimenteiras do Oeste (RO). Na ocasião, o MPF expediu uma recomendação “para que a escola atue para inibir a prática de tais fatos e atue para difundir a existência e história do Povo Guarasugwe”.