Dos jogadores que iniciaram o jogo contra a Colômbia, apenas quatro eram titulares absolutos no Mundial do Catar. Outros quatro não estavam sequer na lista. E a forma de jogar que Fernando Diniz tenta implantar é reconhecidamente autoral, bem distinta do que se praticava com Tite. Era muito difícil que a seleção brasileira não sofresse durante a transição.
A questão é o que acontece depois. Vive-se esta dificuldade, paga-se o preço da mudança importante na lista de convocados, da transformação do modelo de jogo, dos novos métodos, em nome de quê? Fernando Diniz tem todo o direito, e talvez até o dever, de tentar implantar na seleção o tipo de jogo que pratica no Fluminense, por exemplo. Afinal, foi o trabalho nos clubes que o conduziu ao cargo atual. O fato é que o processo mal começou e pode estar terminando. Haverá dois amistosos em março e, se o plano da CBF se concretizar, terminará aí o trabalho de Diniz, que cederá o posto a Ancelotti.
Claro que algo se aproveita, nem que sejam as observações de jogadores que ganharam chances. Mas também é inevitável a sensação de meio ciclo de Copa do Mundo em que se poderia ter caminhado mais.
Luis Díaz gol Colômbia x Brasil
Mauricio Dueñas Castañeda/EFE
Na Colômbia, a seleção foi o retrato de um time em busca de uma nova identidade, ainda que esta seja provisória. Durante 15 a 20 minutos, houve bons sinais. A saída de bola, que desta vez teve André como elemento muito influente, seguiu de forma mais reconhecível os padrões do jogo que Diniz propõe. Acostumados em seus clubes a buscarem passes para zonas menos congestionadas do campo, desta vez os defensores, ajudados pela presença de um volante bem habituado a trabalhar com o treinador no Fluminense, fizeram o oposto. Marquinhos, Gabriel Magalhães e, claro, André insistiram em fazer a bola chegar ao setor esquerdo, onde o Brasil acumulava jogadores. Uma belíssima combinação terminou no gol de Martinelli.
Sempre que se agrupava e se estabelecia no campo ofensivo, com alguma cadência, a seleção ia bem. Mas conforme o jogo passou a impor dificuldades, o time foi perdendo o bom padrão inicial. Um dos riscos da formação tão ofensiva, com Martinelli, Vinícius Júnior, Rodrygo e Raphinha no ataque, é manter a estrutura do time, evitar que os setores se separem. No começo, Rodrygo e Vinícius preenchiam o centro do campo, buscavam a bola perto dos defensores e o jogo fluía. Aos poucos, a característica de um ataque que tende a acelerar sempre, a correr sempre na direção do gol, foi tirando pausa da seleção, opções de passe na saída de bola, e fez o Brasil aceitar um jogo de idas e voltas, sem qualquer controle do ritmo. Uma espécie de choque entre as características dos jogadores e as do jogo que Diniz prefere. O que não significa uma inviabilidade, apenas reflete um processo longe de estar concluído.
Luís Díaz se fartava de provocar duelos pessoais com Emerson Royal, com clara vantagem para o colombiano. O time da casa parecia mais confortável. A lesão de Vinícius Júnior e a escolha de Diniz por João Pedro para substituí-lo não ajudaram. No segundo tempo, a saída de Rodrygo para a entrada de Paulinho reforçou a tendência da seleção a se partir com facilidade em duas partes: os atacantes e o restante do time. Bruno Guimarães se via com dificuldade para receber a bola dos zagueiros e era muito pressionado pelos colombianos. Havia menos opções, ainda que Martinelli tentasse compor como um terceiro meio-campista por vezes, algo pouco habitual para ele.
O Brasil ainda teve um bom momento no início do segundo tempo, quando os colombianos partiram definitivamente para buscar o resultado, mas deram espaços. O Brasil teve boas chances em ataques rápidos, ao menos enquanto Rodrygo esteve em campo. Mas cada perda de bola era um drama para uma seleção que perdia estrutura defensiva quando o rival retomava a bola. E mesmo quando recuava para defender perto de seu gol, o Brasil era pouco agressivo e eficiente. Raphinha ainda chutou uma bola na trave, mas como não aproveitou suas chances, a seleção passou a resistir. Até Luís Díaz acertar duas cabeçadas, a primeira delas contra uma área muito mal defendida.
O resultado ajuda a nos lembrar de outra coisa. As eliminatórias nunca foram o passeio visto nos últimos dois ciclos. O que havia era um time que foi se montando e ganhando solidez. A América do Sul classifica muitos times, é muito provável realizar o objetivo de estar na próxima Copa. O que é diferente de dizer que as partidas são fáceis, que os rivais são frágeis. A seleção precisa é se formar, encontrar seu caminho. Por ora, o que se tem é um trabalho ainda embrionário, e a perspectiva de um novo recomeço no meio de 2024. Quando a transição se aproximar do fim, começará uma nova.