Prata da casa, que se recuperava de lesão no tornozelo direito, faz belo gol em jogo que interrompeu invencibilidade de 16 rodadas do Tricolor Flamengo e São Paulo começam a decidir a Copa do Brasil neste domingo, mas um capítulo especial do confronto aconteceu em 4 de outubro de 2007. Não valia taça, o Maracanã era mais popular, e o Flamengo, bem diferente. Poder de investimento menor, elenco sem estrelas e a rotina de salários atrasados compunham o cenário da época.
O time da moda era o São Paulo, líder do Campeonato Brasileiro com 12 pontos de vantagem numa campanha que tinha a defesa como grande fortaleza tricolor. Talvez por isso nenhum rubro-negro que viveu aquele duelo o esqueça, em especial o grande protagonista da noite: Ibson.
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Ibson relembra vitória em Fla x São Paulo em 2007: "Parece que estou jogando de novo"
O cenário pré-jogo
O imbatível São Paulo não praticava um futebol pouco vistoso e acumulava vitórias magras, tanto que sua média de gols era modesta, de 1,5 por partida (44 em 28 jogos). A base do time de Muricy Ramalho era o sistema com três zagueiros, principal responsável por um grande rendimento defensivo. Chegava ao Maracanã com apenas nove gols sofridos.
O irregular Flamengo, 12º colocado com 37 pontos (26 a menos do que o adversário) entrava na semana do jogo com várias dúvidas. Os dois meses de salários atrasados, o bicho por vitórias e os prêmios pelo Carioca seriam quitados?
E o mais importante: Ibson jogaria?
Um violento pisão sofrido pelo camisa 7 no tornozelo direito durante derrota para o Internacional, no dia 8 do mês anterior, o tirou de quatro jogos e ainda incomodava na semana do jogo com o São Paulo. Ibson teve de passar por testes até Joel Santana confirmá-lo no time titular em entrevista concedida na véspera da partida.
Tema da Vitória embala o 1 a 0
Além de ter o principal jogador daquele elenco confirmado, o Flamengo contou com outro aliado de peso: uma torcida que cantou do início ao fim. A partida, com direito a quebra de recorde de público do Brasileirão 2017 (68.031 e 59.098 pagantes), marcou o "batismo" do Tema da Vitória rubro-negro (Eu sempre te amarei, onde estiver estarei, ó, meu Mengo/Tu és time de tradição, raça, amor e paixão, ó, meu Mengo). Empurrado pela multidão, os rubro-negros foram para cima do São Paulo, pressionaram muito e conseguiram o gol no início do segundo tempo.
O toque de Ibson por cima de Rogério Ceni foi capa do jornal "O Globo" no dia seguinte
Acervo O Globo
Um bonito e chorado gol, com a cara de uma equipe guerreira que tirou o time da penúltima colocação e o conduziu para uma inesperada vaga de Libertadores no fim do ano. Se saiu após um bate-rebate, o toque de Ibson por cima de Rogério Ceni deu beleza ao lance e foi o prenúncio para uma enorme festa. O canto inspirado na música que embalava as vitórias de Ayrton Senna na Fórmula 1 já estava decorada pela arquibancada no fim da partida e foi o mantra daquela noite.
Ibson se arrepia após rever reportagem: "Parece que estou jogando"
Pulmão daquele time, Ibson, hoje aos 39 anos e auxiliar técnico do Amazonas, conversou com o ge sobre aquela partida. Mas a entrevista foi feita sob uma condição: ele só poderia narrar suas lembranças após assistir matéria de Eric Faria (veja abaixo) exibida no Globo Esporte do dia seguinte à vitória do Flamengo. Rubro-negro de coração e principal regente daquela arrancada em 2007, o ex-jogador aceitou o desafio e se transportou para 17 anos atrás e se arrepiou.
Em 2007, Flamengo vence por 1 a 0 São Paulo pelo Campeonato Brasileiro
- Parecia que eu estava jogando novamente enquanto eu assistia (à matéria) e lembrava. Esse jogo foi maravilhoso: estávamos voltando de lesão eu e o Roger. O Joel conversou conosco porque sabia que não íamos aguentar os 90 minutos. Eu comecei jogando, e o Roger, se não me engano, entrou no meu lugar (ouça a declaração de Ibson no vídeo que abre a matéria).
- E a arrancada... A arrancada começou antes, mas o São Paulo vinha invicto há muitos jogos, fizemos uma grande partida, e eu tive a felicidade naquele bate-rebate (risos). A bola acaba batendo no meu peito, eu consegui sair do zagueiro e fazer esse belo gol - detalhou, emendando:
- Não paro de ver o vídeo e vou postar de #tbt (hashtag usada por internautas aos publicar lembranças em redes sociais às quintas-feiras) agora - empolgou-se, durante entrevista realizada na última quinta.
Gentilmente, Ibson atendeu a pedido da reportagem e não postou o vídeo antes da publicação da matéria no ge.
Ibson canta com a galera
Formado numa época em que o "Ó, meu Mengão" era cantado nos aquecimentos dos times de base do Flamengo segundo relato do próprio, Ibson até cantou o "Tema da Vitória" (veja em vídeo abaixo) ao ser perguntado o quanto aquele grito o impactou. As lembranças de jogos com casa cheia não saem da cabeça dele.
- Aquela arrancada foi sensacional, a torcida sempre fazendo aquela festa. É de arrepiar. Eu sempre te amarei, onde estiver estarei, ó, meu Mengo (canta). De arrepiar, cara. De arrepiar porque é uma sensação única, ainda mais eu, que fui criado dentro da Gávea. Aquele ano foi maravilhoso, com apenas bênçãos na minha vida. Apesar de a gente ter que ficar concentrado no jogo, é de arrepiar. Aquela arrancada foi só festa, com o mínimo de público em cada jogo com 60 mil.
Ibson canta "Tema da Vitória" da torcida do Flamengo
A tal "arrancada" mencionada por Ibson terminou com mais sete vitórias nos nove jogos finais do Campeonato Brasileiro. O Flamengo terminou na terceira colocação, com 61 pontos.
2007, o ano de Ibson
A temporada marcava o retorno de Ibson à Gávea. Prata da casa, profissionalizou-se em 2003 e saiu dois anos depois, quando transferiu-se para o Porto. Voltou na condição de emprestado pelos portugueses. Comandados por Papai Joel, ele e outros reforços chegaram no segundo semestre de 2007 para mudar a cara do time e liderar a arrancada rumo ao G-4.
- Essa volta para o Flamengo representou tudo. Flamengo tava em penúltimo, chegamos eu, Fábio Luciano, Maxi Biancucchi, Cristian e Roger. Eu estava há bastante tempo sem jogar porque vinha de uma lesão no joelho. E com a chegada do Papai Joel, o time engrenou, deu uma liga muito boa. Grandes pessoas, grandes jogadores.
No campo pessoal, o craque também batia uma bolão. O ano também marcava o casamento com Cinthia e o nascimento de Ibson Júnior - hoje o ex-atleta também é pai de Alicia.
- Foi um ano muito especial em todos os sentidos. Nascimento do meu filho, meu casamento e poder voltar ao Brasil e ao Flamengo e reencontrar essa torcida. É o meu time do coração. Poder viver isso tudo foi muito bom, muito maravilhoso. Poder reviver isso está sendo muito bacana. Fui eleito o melhor da minha posição, fora essa arrancada. Esse jogo foi muito marcante para mim. Vendo agora e relembrando me deu uma nostalgia muito grande, cara. Sensação maravilhosa ver a torcida, agora a gente só acompanha de longe.
Mas a distância não é problema. Assim como diz a música, onde o Flamengo estiver, Ibson estará. Ainda citando o time de 2007, avisou que lá de Manaus estará torcendo pelo título da Copa do Brasil. Mas, nostálgico, aproveitou para encerrar a entrevista citando outras lembranças daquela vitória por 1 a 0 sobre o São Paulo. E, ao recordar, bateu aquela vontade de voltar no tempo e ser campeão de novo.
- No outro dia, ao acordar, é muito bacana. Você lê o jornal e tem nota boa, vitória em cima do São Paulo. Foi um ano maravilhoso. Acredito eu que se tem mais três ou quatro jogos, a gente ia ser campeão. Reviver isso foi muito bacana, te agradeço pela lembrança. E domingo tem Mengão, vamos em busca desse título. Estamos na torcida, mas falando novamente: Que momento. Que momento, cara. Foi muito bacana. Nas ruas já tínhamos o reconhecimento, mas foi ainda maior. Fiquei muito feliz com o que aconteceu nesse ano e principalmente nesse jogo.
Com 233 jogos e 35 gols como profissional rubro-negro, Ibson foi consagrado no gramado um grande jogador da história do Flamengo. Ganhou três Cariocas e um Brasileiro, mas suas belas partidas o tornaram um jogador inesquecível não apenas pelas taças. A Copa do Brasil não conquistou em campo, mas espera vê-la em mãos rubro-negras mais uma vez. Agora, como fazia quando pequenininho, na condição de torcedor.
Matéria de "O Globo" destacou a torcida do Flamengo contra o São Paulo
Acervo O Globo
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