Três das quatro finais de Liga dos Campeões na história do clube tiveram treinadores nascidos fora de Portugal. Schmidt pode manter a escrita. Um dia é da caça, outro, do caçador. Se treinadores portugueses estão invadindo cada vez mais o futebol brasileiro, ao menos um clube na terrinha faz o movimento inverso: tem seus maiores sucessos com treinadores nascidos fora de lá.
Escrita que o alemão Roger Schmidt tentará manter viva no Benfica, que enfrenta a Internazionale nesta quarta, às 16h, por uma virada para chegar na semifinal da Liga dos Campeões.
No jogo de ida, os italianos venceram em pleno Estádio da Luz por 2 a 0.
Roger Schmidt PSV
Getty Images
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Clube português com mais títulos (empatado com o Porto) e finais de Liga dos Campeões, o Benfica disputou a decisão da competição em sete oportunidades. Em seis delas, foi treinado por alguém nascido fora de Portugal:
1960/61: treinador húngaro, Béla Guttmann
1961/62: treinador húngaro, Béla Guttmann
1962/63: treinador chileno, Fernando Riera
1964/65: treinador romeno, Elek Schwartz
1967/68: treinador brasileiro, Otto Gloria
1987/88: treinador português, Toni
1989/90: treinador sueco, Sven-Goran Eriksson
Treinadores nascidos foram de Portugal fazem tanto sucesso lá que, juntos, conquistaram praticamente o dobro de títulos no clube se comparados a portugueses: 55 contra 27.
Hungria, o começo de tudo
A invasão estrangeira na Luz começa na década de 1940, com as conquistas dos húngaros Lipo Herczka e Janos Biri. A geopolítica explica: vindos de uma das potências futebolísticas nos períodos entre as duas guerras mundiais, treinadores húngaros buscavam um local que desse projeção esportiva e fosse tranquilo de trabalhar.
Alemanha e Itália, fora de cogitaçào cogitação. A Inglaterra na época não aceitava estrangeiros na liga. A França não tinha um futebol tão desenvolvido, e na Holanda sequer era profissional. Sobrou Portugal, que tinha também algumas similaridades com a Hungria: nações pequenas, com períodos de grandeza na história e uma economia humilde, de valorização do trabalho diário.
Quem mais se destacou foi Béla Guttmann. Após vencer o Paulista com o São Paulo, ele treinou o Porto e depois o Benfica e revolucionou o futebol no país. Implementou metodologias de treinamentos diferentes, mudou o WM da época para um 4-2-4 mais parecido com o Brasil e descobriu o crraque Eusébio.
Béla Guttman mudou o futebol em Portugal e no Brasil
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O Benfica teve um timaço na década de 1960. Chegou a cinco finais europeias e venceu duas delas, todas com Guttmann. É dele a famosa "maldição" de que o Benfica não ganharia nada após sua saída.
Na década de 1970 e 1980, treinadores de outros centros da Europa desembarcavam na Luz e fizeram excelentes trabalhos.
O inglês Jimmy Hagan foi tri-campeão português. O sueco Sven-Göran Eriksson se projetou ao mundo lá, competindo demais com o Milan na final da Liga dos Campeões. Trabalho que o credenciou a ir para a Sampdoria, Lazio e depois Inglaterra. Outro a passar por lá foi o italiano Giovanni Trapattoni, que misturou conceitos da marcação por zona dos suecos com a marcação individual que foi tão dominante na Itália durante a década de 1960.
A escola de treinadores portugueses, famosa com Abel Ferreira e Jorge Jesus, passava longe de ser o que era hoje. Dirigentes e "adeptos" sempre queriam um treinador com novidades. Artur Jorge e Toni foram treinadores portugueses que fizeram sucesso, mas muitas vezes eram acusados de serem meros "gestores de elenco". Lembrou de um certo país?
O movimento de valorizar tudo o que vem de fora torna a lista de técnicos do Benfica um tanto curiosa. Por lá passaram:
O brasileiro Paulo Autuori, que deixou o Botafogo em 1995 para passar uma temporada na Luz
O holandês Ronald Koeman, no começo de carreira e no primeiro trabalho fora da Holanda
O alemão Jupp Heynckes, já campeão da Europa com o Real Madrid e que custou caríssimo na época
O escocês Graeme Souness, que começou promissor, teve passagem curta pelo Liverpool e nunca aconteceu de verdade
Paulo Autuori no Benfica
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Jorge Jesus quebra a escrita e faz história
Após os fracassos dos espanhóis José Antonio Camacho e Quique Flores, a direção do Benfica arriscou e apostou num cabeludo excêntrico que fazia grande trabalho no Braga: Jorge Jesus.
O mítico ex-treinador do Flamengo romper a sina de fracassos de treinadores portugueses e se tornou o treinador mais vitorioso da história do clube, com três Campeonatos Portugueses, 5 Taças da Liga, 1 Taça de Portugal e 1 Supertaça Cândido de Oliveira.
Foi com ele que o Benfica finalmente volta a competir a nível europeu. Chegou nas quartas-de-final da Liga dos Campeões e em duas finais de Liga Europa. Para muitos, era aquele time que merecia o título que o Chelsea do sempre pragmático (e excelente treinador) Rafael Benitéz conquistou em 2013.
Jorge Jesus deixou o Benfica no fim de dezembro e só vai voltar a trabalhar na próxima temporada
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O sucesso de Jesus abriu as portas para Rui Vitória e Bruno Lage. Mas seu retorno cercado de expectativa e recheado de fracasso fez o clube apostar alto no alemão Schmidt, que começou promissor e fazia bom trabalho no PSV.
Com apenas três derrotas na temporada, o Benfica foi apontado por muitos como o "melhor futebol da Europa" pelas goleadas, mesmo com investimentos mais moderados e a ausência de Enzo Fernández, vendido ao Chelsea. Os "encarnados" foram a surpresa do grupo na Champions: venceram a Juventus duas vezes, inclusive em Turim, e empataram com o PSG de Neymar, Messi e Neymar.
O desafio da vez é a Internazionale, mesma adversária da final de 1967/68, com o brasileiro Otto Gloria. Legado que Roger Schmidt quer manter vivo para fazer o futebol sensação da temporada chegar a um feito que não acontece desde 1990: uma semifinal de Liga dos Campeões. E quem sabe chegar na decisão?