Meia e lateral Mayke processam a empresa de Willian Bigode e a Xland Holding por suposto golpe no investimento em criptomoedas. Conversas indicam que Weverton também foi lesado Enquanto brilhava na campanha que levou o Palmeiras ao título brasileiro de 2022, Gustavo Scarpa vivia um drama pessoal. Os R$ 6,3 milhões que investiu em criptomoedas por indicação do ex-companheiro de time Willian desapareceram.
Mensagens de texto e de áudio revelam detalhes do suposto golpe sofrido por Gustavo Scarpa
Melhor jogador do Campeonato Brasileiro do ano passado, Scarpa acusa a empresa de Willian, a WLJC Consultoria e Gestão Empresarial, e a Xland Holding Ltda de um golpe milionário. Uma outra ação é movida pelo lateral-direito Mayke, que investiu R$ 4,083 milhões. Há indícios de que o goleiro Weverton também foi lesado.
Áudios revelados pelo Fantástico neste domingo mostram conversas entre Scarpa, Willian e os donos da Xland, Jean Ribeiro e Gabriel Nascimento. O jogador, hoje no Nottingham Forest, da Inglaterra, procura os envolvidos no caso para tentar recuperar o dinheiro que investiu. Sem sucesso.
– Fica em paz que eu quero lhe pagar. Não quero ficar recebendo mensagem sua direto, não. Não aguento mais receber mensagem sua – escreveu Gabriel Nascimento a Scarpa, por mensagem de texto.
– Não aguenta mais? Você me rouba, e você não aguenta mais? Você roubou minha família – rebateu o jogador.
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O meio-campista foi apresentado à Xland por Willian em junho de 2020 por meio de um arquivo com uma apresentação sobre criptomoedas. Em áudio, o atual jogador do Fluminense afirma que a empresa no qual é sócio tem "nossa fidelidade e parceria com a Xland".
A promessa era de que o lucro poderia chegar a 5% ao mês, muito acima do que qualquer aplicação no mercado. Para convencer Scarpa a investir, Gabriel Nascimento chegou a dizer que a empresa tinha R$ 2,1 bilhões em pedras de alexandrita, um mineral de grande valor, além de possuir chácaras e terrenos como garantia.
Scarpa passou a desconfiar de um possível golpe apenas em agosto de 2022. O jogador comunicou à Xland que gostaria de resgatar parte de seu dinheiro, mas não conseguiu.
Willian, Mayke e Scarpa pelo Palmeiras em 2021
Cesar Greco / Ag Palmeiras
– Cadê os seguros das pedras preciosas? Cadê tudo aquilo? Tudo patifaria. Eu me meti com estelionatários. Jamais imaginei passar por isso na minha vida – lamentou Scarpa, em mensagem a Jean Ribeiro.
Ele, então, pediu ao ex-companheiro de Palmeiras que intercedesse. Willian, porém, disse que também foi lesado. Em depoimento à polícia, o atacante afirmou que perdeu R$ 17,5 milhões, enquanto a sócia dele, Camila Moreira Fava, R$ 1,6 milhão.
– Sempre via as pessoas burras que caíam em pirâmide, essas coisas de estelionatários. E me ver numa situação dessa, para mim, está sendo horrível.
– É meu patrimônio quase todo. Eu não posso correr esse risco de perder – disse Scarpa.
– Nunca tinha dado problema, nada. E você vai criando essa confiança. Metade do meu patrimônio. Você tá doido, tô aqui desesperado. Mas fica tranquilo que você vai, dentro dos seus direitos, óbvio, ter o dinheiro de volta. Fica tranquilo, tá bom, Scarpinha? – afirmou Willian, em outra mensagem.
Depósito irrisório no dia do título Palmeiras
Depois de diversas desculpas por problemas nas transações bancárias, a Xland depositou R$ 1,2 mil na conta de Scarpa. Isso aconteceu em 2 de novembro, dia em que o Palmeiras se sagrou campeão brasileiro antes mesmo de entrar em campo contra o Fortaleza.
– Quando chega na minha conta R$ 1,2 mil, eu falei: "Eles estão de sacanagem com a minha cara. Não é possível". Eu tendo final de campeonato hoje, completamente desconcentrado. Por que você não me faz a transferência agora, nesse exato momento? – perguntou Scarpa, em áudio, a Gabriel Nascimento.
– Eu vou te fazer. Eu vou te fazer a transferência – respondeu o dono da Xland, que não efetuou a devolução do dinheiro.
Outro personagem do caso é Marçal Siqueira, que se apresenta como coach em desenvolvimento humano e gestão financeira. Segundo Willian, foi Marçal quem o apresentou à empresa acusada de golpe.
Marçal Siqueira, ao centro, em reunião encontro com sócios da Xland
Reprodução
O coach recebia comissões a cada novo cliente que captava. Scarpa pediu para que ele fosse a Rio Branco-AC, sede da Xland, para cobrar a devolução do dinheiro. Mas a resposta, no dia do jogo do título do Palmeiras, foi desanimadora.
– Você tem algum contato com PF (Polícia Federal), Scarpa? Peça para fechar mesmo fronteiras, porque eu não tenho mais esperança – disse Marçal, em áudio.
No dia seguinte, Gustavo Scarpa registrou Boletim de Ocorrência contra a Xland e a empresa de Willian. O lateral-direito Mayke, do Palmeiras, outro que tentou resgatar o dinheiro investido, também prestou queixa.
– Eu, campeão brasileiro, quase que chorando por dentro. Comemorando, e um vazio, falando: "Mano, onde eu fui me meter?" Que arrependimento do caramba – afirmou Scarpa, em outro áudio.
Em meio ao suposto golpe, Scarpa andou de skate no gramado após título do Palmeiras
As conversas que a reportagem teve acesso indicam que o goleiro Weverton, do Palmeiras, também perdeu dinheiro. Procurado, ele não quis se manifestar. A empresa diz ter um "acordo em tratativa" com o jogador.
– Tô me sentindo burro, mano. Burro! Que investimento no mundo que dá 5% no mês? Que dá 3% no mês? – lamentou Scarpa, em mensagem de voz.
Ministério Público já investigava a Xland
Há mais de dois anos, o Ministério Público do Acre abriu uma ação civil pública contra a empresa. Ela responde a três processos na Justiça sob a acusação de ter aplicado um golpe de mais de R$ 2 milhões em investidores.
Em depoimento à polícia, Willian e a sócia Camila afirmam que também foram vítimas da Xland. O jogador chegou a ter as contas bloqueadas, mas a Justiça reverteu a decisão na última sexta-feira.
Em outra decisão, o tribunal determinou o bloqueio de R$ 13 milhões dos bens que estão em nome da Xland. Nas contas da empresa, porém, foram encontrados menos de R$ 80 mil.
Jean Ribeiro e Gabriel Nascimento, sócios da Xland
Reprodução
Gabriel Monteiro, sócio da Xland, alega que é vítima da FTX, a segundo maior corretora de criptomoedas do mundo. O grupo faliu em novembro de 2022, causando prejuízos a investidores do mundo todo.
– Operávamos todos os recursos dos clientes dentro da FTX. Nós tínhamos uma totalidade de 600 e poucos clientes, superava R$ 80 milhões. A gente está se organizando juridicamente para entrar com nosso recurso dentro da fila porque agora tem uma fila de recuperação judicial para todos os clientes – justificou Gabriel, sem apresentar os documentos que garantem o investimento na FTX.
Ele também isentou Willian de culpa e não quis colocar uma data para a devolução do dinheiro.
– O Willian não tem nenhuma responsabilidade do que aconteceu com a empresa. Ele também é uma vítima, assim como nós, a empresa.
Gustavo Scarpa optou por não dar entrevista e pediu para que seu advogado se pronunciasse em nome dele. Carlos Henrique de Oliveira Pereira afirmou que o jogador está "muito decepcionado, inconformado e bem chateado" com Willian.
Em nota, o advogado de Marçal Siqueira disse que "nenhuma conduta dele se aproxima da má fé" e que seu cliente "não tem nenhum poder de decisão na Xland".
Jean Ribeiro não retornou os contatos da reportagem.
