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Cafu diz que Seleção perdeu o respeito e é refém de Neymar: "Ninguém ganha título sozinho"

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Ao Abre Aspas, capitão do penta afirma ser contra treinador estrangeiro na Seleção e acredita que outros jogadores podem dividir a responsabilidade com o astro na Copa do Mundo Abre Aspas: Cafu defende Ronaldo na CBF e ainda vê Seleção refém de Neymar

Marcos Evangelista de Morais conquistou praticamente tudo o que o futebol pode proporcionar a um atleta. Aos 54 anos, o capitão da seleção pentacampeã do mundo e que fez fama com o apelido de Cafu agora quer ajudar a mudar a imagem do futebol brasileiro, que, segundo ele, foi descontruída desde o título conquistado em 2002.

– O primeiro momento é fazer com que o Brasil volte a ser respeitado nas Confederações, na Fifa e mundialmente. Acho que esse é o principal de tudo, porque matéria-prima nós temos, jogador nós temos, talento nós temos. O que nós precisamos é dar tranquilidade para esses talentos, para que eles possam desenvolver o que eles sabem fazer, jogar futebol.

– Depois de tudo que acabou acontecendo, a falta de transparência, anunciar um treinador que nós sabíamos que não viria para a seleção brasileira, a demora de anunciar um treinador depois que o Tite já tinha se desligado, acho que essa falta de informação, essa falta de comunicação e algumas comunicações que acabaram não acontecendo, geraram um desgaste na CBF – disse Cafu.

Cafu foi o capitão do último título de Copa do Mundo conquistado pelo Brasil

Marcos Ribolli

Para ele, a dependência pelo futebol de Neymar nos últimos anos foi o grande motivo para a seca de conquistas. Mesmo assim, confia que ele e a próxima geração podem voltar a colocar o país no ponto mais alto do futebol mundial. Por isso, é contrário à chegada de um técnico estrangeiro.

– Eu sigo o raciocínio de que precisa ser um treinador brasileiro. Nada contra os treinadores estrangeiros, pelo amor de Deus. Mas eu acho que o Brasil merece ganhar uma outra Copa do Mundo novamente com um treinador brasileiro. Nós sempre tivemos referências com treinadores brasileiros.

– Nós ficamos durante quase 14 anos dependentes de um único jogador, do Neymar. Nosso maior jogador, nosso maior ídolo, o jogador que nós sabemos que a qualquer momento poderia resolver o nosso problema. Me fala, qual que é o ídolo nacional hoje, depois do Neymar, no absoluto, mundial? Depois do Neymar nós não tivemos um ídolo.

– O Neymar foi o nosso último ídolo. E durante 14 anos nós ficamos dependentes do que o Neymar fazia. E a gente sabe que se você ficar dependente de um único jogador, você não vai ganhar uma Copa do Mundo. É impossível. Você não ganha a Copa do Mundo dependendo de um único jogador – disse Cafu.

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Para isso, acredita que a candidatura de Ronaldo Fenômeno para a presidência da CBF pode ser o início de uma participação maior dos jogadores na recuperação do prestígio e do respeito para com a escola mais vitoriosa do esporte mais popular do mundo.

– É um candidato, não sabemos se o Ronaldo vai ganhar ou não. Mas só o fato dele se candidatar já demonstra que alguma coisa eles querem mudar. E nós esperamos que mude alguma coisa, porque sempre que você muda a diretoria, sempre que você muda o treinador, sempre que você muda o jogador, você tem aquela perspectiva de que algo vai mudar. Para melhor, a gente espera. Mas toda mudança requer um pouco de tempo, um pouco de paciência. O Ronaldo é um cara visionário, é um cara inteligente.

– Ele já vem aí de uma experiência, de uma SAF que ele montou no Cruzeiro que acabou dando certo. A SAF deu certo. A partir daí, as SAF's começaram a se aperfeiçoar mais no futebol brasileiro. E a gente espera que, se der certo a candidatura do Ronaldo, se der certo que o Ronaldo possa vir a ser o presidente da CBF, possa abrir espaço para outros jogadores criarem uma comissão, que possa realmente fazer algo de bom para o futebol.

– Porque nós não queremos o mal do futebol. Ele não vai entrar lá para querer prejudicar o futebol brasileiro ou para querer prejudicar as pessoas. Ele vai entrar lá para querer promover mudanças, mudanças que a gente acha que são viáveis para o futebol brasileiro – disse Cafu, que atualmente dá palestras e participa de eventos corporativos.

Ficha Técnica

Nome completo: Marcos Evangelista de Morais (Cafu)

Nascimento: 7 de junho de 1970 (54 anos)

Carreira: São Paulo, Zaragoza, Juventude, Palmeiras, Roma, Milan e Seleção Brasileira.

Principais títulos: Copa do Mundo (1994 e 2002); Copa América (1997 e 1999); Copa das Confederações (1997); Libertadores (1992 e 1993); Mundial de Clubes (1992, 1993 e 2007); Recopa Sul-Americana (1993 e 1994); Campeonato Paulista (1991, 1992 e 1996); Campeonato Brasileiro (1991); Champions League (2006-07); Supercopa da Uefa (2003 e 2007); Campeonato Italiano (2000-01 e 2003-04) e Supercopa da Itália (2004).

Cafu atualmente trabalha com palestras sobre futebol e o mundo corporativo

Marcos Ribolli

Multicampeão por São Paulo, Palmeiras, Milan e Roma, além da seleção brasileira, Cafu analisou o atual estágio do futebol brasileiro e as mudanças que considera necessárias.

– O trabalho do Dorival é ótimo. Vai ser excelente quando o Brasil estiver decretado. Realmente classificado para a Copa do Mundo de 2026. E vai para a Copa do Mundo. Vocês podem ficar tranquilos. O Brasil vai para a Copa. Vai classificar. Vai ganhar. Vai perder. Vai empatar. Vai jogar bem. Vai jogar mal. Mas vai para a Copa do Mundo. Chegou na Copa do Mundo é um outro discurso. As eliminatórias para a Copa do Mundo mais difíceis são as sul-americanas. Nós temos 10 times. E qualquer um dos 10 pode ir para a Copa a qualquer momento. Olha só como é que é difícil. Mas o trabalho do Dorival é um ótimo trabalho. Ele pegou uma Seleção completamente desestruturada.

Cafu vê lateral da Seleção bem servida e brinca sobre montar escola para posição

Mesmo elogiando o trabalho de Dorival, Cafu diz que não teria demitido Fernando Diniz.

– A troca eu não teria feito. Mas como trocou, como torceu para o nosso treinador, eu não teria feito. Eu teria deixado o Diniz. Foi o que eu falei lá no começo. Nós passamos por quatro treinadores quase. Em menos de quatro anos para uma Copa do Mundo. Como é que você entrosa o time? Você não entrosa, vem de um padrão de jogo do Diniz que é completamente diferente do padrão de jogo do Dorival, que é completamente diferente do padrão de jogo do Tite.

Em entrevista de 1h20 ao Abre Aspas, na sede da Globo em São Paulo, Cafu comentou sobre a rotina como ex-atleta, como mantém a forma e ainda abriu o jogo sobre os jogadores que considera talentos desperdiçados por não terem conseguido longevidade na carreira, além de bastidores sobre o futebol.

Abre Aspas: Cafu

O que mudou entre a carreira de atleta e o mundo corporativo?

– A diferença do corporativo é a maneira de se vestir, de se posicionar, a linguagem é completamente diferente daquela que nós usamos dentro de campo. Claro que a responsabilidade é bem menor, porque quando você está disputando, por exemplo, a final de Copa do Mundo, você tem 205 milhões de brasileiros vendo o que você está fazendo, se você comete um erro praticamente eles acabam te crucificando. O mundo corporativo é completamente diferente, você tem a oportunidade, de repente, de errar e consertar esse erro.

– Mas a responsabilidade, eu costumo falar que é sempre a mesma, tanto dentro de campo como fora de campo, é a mesma. O comprometimento, a fisionomia, a maneira com que você trata as pessoas, eu acho que isso o futebol me ensinou bastante, disciplina, comprometimento, foco e determinação. E eu levo isso para o mundo corporativo também, porque o mundo corporativo precisa ter foco, precisa ter planejamento, precisa ter disciplina e eu consegui fazer essa analogia entre o futebol e a empresa. E acabou dando certo.

Você já tinha esse norte quando decidiu aposentar ou depois que pendurou as chuteiras que começou a seguir para esse caminho?

– Foi depois que eu pendurei as chuteiras, exatamente depois, não tinha a mínima ideia que seguiria para esse norte. A minha ideia era parar com o futebol, trabalhar na parte administrativa de algum clube, trabalhar de repente, sei lá, na CBF, na parte administrativa, trabalhar com jovens, sempre tive muita vontade de trabalhar com jovens.

– Eu não tinha a mínima ideia que iria me tornar um palestrante e com o decorrer do tempo fui gostando, pegando gosto, vendo palestras, vendo pessoas falando, vendo qual era o nicho que eu poderia me enquadrar dentro das palestras, em que momento eu poderia enquadrar o que o futebol me ensinou, o que aprendi com o futebol e o que poderia passar para o mundo corporativo dando palestra.

– Porque na minha palestra eu falo muito de liderança, falo de foco, de determinação, de planejamento, foi tudo aquilo que praticamente vivi dentro do futebol. Então, ficou bem mais fácil do que imaginava. Eu via as pessoas falando, ia na palestra e falava: "Caramba, o cara está falando para sete mil pessoas, o cara não gagueja, ele não erra, a vírgula dele é perfeita". Então, eu achava que aquilo seria quase que impossível de fazer.

Cafu, ex-lateral e pentacampeão mundial com o Brasil

Marcos Ribolli

– Então, depois que fiz a primeira, fui aperfeiçoando, corrigindo os erros, gosto muito que as pessoas me corrijam. Então, cada palestra que fazia, eu falava: "olha, onde é que eu errei, o que falei de errado, qual palavra que eu não encaixei bem, qual "s" que acabei engolindo, que engolia muito os "S's". Então, fui aperfeiçoando, vendo os erros que cometia nas palestras, no encaixe das palavras.

– Aprendi que se falar errado, tenho que continuar, não posso parar, porque depois você acaba, num outro parágrafo, corrigindo o erro que você falou anteriormente e isso quem me deu foi o tempo, foi a vida que acabou me ensinando. Agora eu tenho em casa a Mariah [esposa] que não deixa eu falar uma vírgula errada. Ela está na Academia da Grande São Paulo de Letras, então todas as palestras que ela fala qualquer coisa que falo errado, ela fala: "vida, olha, eu acho que essa palavra poderia encaixar dessa maneira". E aí você acaba aperfeiçoando.

Acha que mudou a relação dos jogadores com a imprensa? Não existe mais a espontaneidade nas entrevistas?

– Antigamente, de verdade, nós tínhamos mais esse tete-à-tete com a imprensa. Antigamente era aqui, olhar nos olhos, falar, discutir, brigar, tirar ali satisfação na hora. Hoje, com os comunicados, o assessor acaba falando para o jogador, o jogador acaba falando diretamente pro repórter, pra pessoa. Eu acho que hoje ficou mais fácil.

– Porque antigamente você tinha que ir lá na hora, no calor da entrevista, de uma derrota ou de uma vitória, o cara colocar o microfone na sua boca e falar: "E aí, o que você acha dessa derrota? O que você vai falar para o cara?". É óbvio que eu não gostei. Mas, no calor, você acaba falando coisas que você não deve falar e acabava gerando muita polêmica. Hoje, não. Hoje tá bem mais fácil. Hoje, as pessoas, através dos comunicados, conseguem expressar um pouco melhor o palavreado para as pessoas do que antigamente.

Você acha que ficou mais chato ou não?

– Ah, eu acho que ficou. Eu falava muito com o Pascoal, né? [Osvaldo Pascoal, repórter]. O Pascoal é uma amigaço. Então, o Pascoal, depois que terminava o jogo, cara, a gente terminava a entrevista, se sentava no segundo até ficar batendo papo. Então, você tinha esse tete-à-tete com o repórter, mesmo que você sabia que ele não ia te colocar em fria, sabia que ele não ia falar a coisa que você falou ali depois do jogo. Então, cara, você poderia falar com ele do que você quisesse, sem que gerasse qualquer tipo de polêmica. Então, tinha um lado afetivo muito grande, muito humano entre o jogador e o jornalista, o jogador e o repórter, o repórter e a família, o jornalista e o jogador.

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Você vai participar de eventos, aí vai ter um influenciador, vai ter um youtuber. E, às vezes, ele não quer nenhuma entrevista. Ele quer um desafio ali, saber se o Cafu jogou mais ou menos do que alguém....

– Mudou bastante, né? Agora, eles têm essa competição. Quem foi melhor do que quem, qual a melhor seleção, qual o melhor jogador. Você foi melhor do que o Carlos Alberto, foi melhor do que o Daniel Alves. Eles começam a comparar e eu falo muito para eles: "Gente, eu não gosto muito de fazer esse comparativo". Porque eu falo que cada um foi bom na sua época, cada um foi bom no seu período. Antigamente, eles falavam quem foi o melhor: o Pelé ou a Maradona? Cara, foram os dois melhores jogadores da história do futebol mundial.

– Não dá para eu falar para você se o Maradona foi melhor do que o Pelé ou se o Pelé foi melhor do que o Maradona. Os dois jogaram para caramba. Os dois fizeram história no futebol mundial. O Pelé é extraterrestre, o Maradona chegando ali perto de ser um extraterrestre também. Então, o linguajar mudou muito do jogador de futebol hoje, principalmente como vocês acabaram de citar. Os influencers estão com um linguajar completamente diferente, você tem que se adaptar.

Costuma consumir programas esportivos? Assiste bastante televisão?

– Quando eu vejo um bom debate, eu falo, paro, ainda falo sozinho, parece que eu estou no debate junto com os caras, dou palpite no debate dos caras que eles não estão sabendo do que está acontecendo, mas eu gosto de um bom debate, gosto de uma boa entrevista, gosto de um bom repórter que te faz perguntas, que não vai te colocar em dificuldade, principalmente com os meninos que estão subindo agora.

– Porque hoje, principalmente para essa garotada que infelizmente não está preparada para dar entrevista em massa. Então se você faz qualquer pergunta que possa colocar esse menino em dificuldade, ele vai responder. Sem ter a malícia de que aquela pergunta pode ter duplo sentido.

– Então é isso que eu acho que tinha que mudar também. A maneira de abordar esse jovem, de abordar os meninos, a maneira com que você vai falar com eles, porque não adianta vocês falarem de coisas completamente difíceis para um menino que acabou de completar 12 anos e está subindo agora para o profissional. É óbvio que ele vai ter dificuldade de responder algumas coisas. Então eu acho que isso mudou bastante.

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Marcos Ribolli

Acha que a partir disso foi quando os ex-jogadores ganharam cada vez mais espaço na televisão, na imprensa?

– Eu vejo dessa forma. Se você é capaz, você tem espaço em qualquer lugar do mundo. Se você se preparou, estudou, você tem lugar em qualquer espaço do mundo. Eu vejo que tem espaço para todos no mundo esportivo. Para o jogador, para o jornalista, para o treinador, para o torcedor. Se você se capacitou, se você estudou, se você é capaz de fazer um comentário ou de estar com um jornalista falando tete-à-tete de um assunto que você tem domínio, acho isso super legal. É uma troca de experiência do jornalista com o jogador.

– O advogado, quando vai falar para você de um contrato, ele coloca lá umas palavras que eu falo: "Caramba, que raio de palavra que é essa?". Eu falo, está vendo, doutor, eu não vou saber o significado dessa palavra. Então, no meu linguajar, eu falaria dessa maneira. Ele fala, no meu falaria dessa forma. E esse linguajar entre o jornalista e o jogador, isso é legal. Porque o jogador que for inteligente, ele vai pegar algo do jornalista. E se o jornalista for inteligente, ele vai pegar muita coisa do jogador.

– Porque nós vivemos a prática. Talvez o jornalista tenha vivido na teoria. E se você juntar essa teoria com a prática, em um ambiente legal, que ninguém quer dar chapéu em ninguém, que ninguém quer passar o pé de ninguém, que ninguém quer ser mais do que ninguém, acho que essa mescla entre o jornalista e o jogador está bacana.

– É óbvio que tem muitos jogadores hoje ganhando espaço, sim, no mundo jornalístico, nos programas esportivos, nos programas de televisão. Mas você vê que são jogadores completamente capacitados, estão de frente para a televisão ao vivo para o mundo inteiro e sabe que o cara não vai gaguejar. Por quê? Porque se preparou. Então acho que tem espaço para todo mundo.

Um outro espaço que está sendo muito ocupado por ex-jogadores é o do executivo de futebol. Nunca mais pensou nisso, Cafu? É algo que você poderia trabalhar, que você ainda vislumbra, quem sabe no futuro?

– Poderia trabalhar, sim, no futuro, sem sombra de dúvida. A cada ano que termina uma Copa do Mundo, eu falo: "Agora eu vou parar com a Copa, vou dar um tempo e vou entrar no mundo corporativo como administrador ou trabalhar em um clube, na própria CBF". Um setor que eu domino, que gosto, que é a transição entre o jovem e o principal.

– Eu acho que nós temos uma carência muito grande nesse aspecto. Preparar o jovem para que ele possa chegar no time principal, preparar o jovem da sub-20 para que ele possa chegar na seleção principal de uma maneira bem tranquila. Essa era a função que eu tinha vontade de fazer, tenho vontade e vou fazer. Eu espero que depois dessa Copa de 2026 eu possa ter um pouco mais de tranquilidade e aí eu vou começar, sim, a me preparar para fazer esse tipo de trabalho.

E o que achou da candidatura do Ronaldo à presidência da CBF?

– Eu achei legal. E eu fiquei mais feliz ainda que eu vi uma notícia no jornal outro dia que ele levaria o Mauro Silva para ser o vice dele na chapa. Perfeito. Você está juntando um cara extremamente experiente, competente, capacitado, que é o Mauro Silva, que já trabalha na Federação Paulista, que praticamente é quase que já o presidente da Federação Paulista quando o Ronaldo está em missão oficial, quem assume é o Mauro Silva, já demonstrou que é capacitado para isso. Cara, quando eu vi no jornal que o Mauro Silva pode ser o vice do Ronaldo, é o pontapé inicial para que possa haver mudanças no futebol brasileiro, que para mim é o melhor futebol do mundo ainda.

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Você acha que faltou em algum momento os jogadores tentarem tomar o controle da CBF?

– É, eu nem usaria a palavra tomar o poder da CBF. Eu acho que em conjunto com a CBF, montar uma comissão com as pessoas que lá estão administrando para que a gente possa ter melhorias no futebol brasileiro. Porque quando você fala: "Ah, o Ronaldo vai entrar na CBF porque aconteceu isso, aquilo, não". Nós queremos que ele entre na CBF para que ele possa promover mudanças em benfeitoria do futebol brasileiro, que ainda é um dos melhores futebol do mundo, é a seleção brasileira, é a única seleção pentacampeão do mundo, e tem que ser respeitada.

– E de alguns anos para cá, nós vimos algumas coisas que aconteceram na CBF que prejudicou o futebol brasileiro, que foi ruim para a imagem do futebol brasileiro. E o que nós queremos fazer é exatamente isso, é resgatar novamente a imagem do grandioso que é o futebol brasileiro.

Teve a oportunidade de falar com o Ronaldo depois que ele anunciou a candidatura?

– Tive a oportunidade de conversar com ele assim, vagamente, bem rápido, não sentamos ainda para fazer papo, mas já falei para ele que estamos todos à disposição para que possa ajudar, e se ele precisar, estaremos à disposição do futebol brasileiro. Porque quando a gente fala de ajudar o Ronaldo, não é que nós queremos tirar o presidente que está na CBF, isso jamais, até porque o Ednaldo é muito meu amigo, o Ednaldo é parceiraço, mas quando se trata de eleições, um tem que ganhar e o outro não. Então, o que nós queremos é o bem da seleção brasileira, seja com o Ednaldo, seja com o Ronaldo, seja com o Mauro Silva, seja com o Reinaldo, seja com quem estiver lá. O que nós queremos

Se o Ronaldo te pedisse conselhos, o que você falaria para ele como prioridade para um presidente da CBF, caso ele vença? O que tem que ser atacado no primeiro momento?

– O primeiro momento é fazer com que o Brasil volta a ser respeitado nas confederações, na Fifa e mundialmente. Acho que esse é o principal de tudo, porque matéria-prima nós temos, jogador nós temos, talento nós temos. O que nós precisamos é dar tranquilidade para esses talentos para que eles possam desenvolver o que eles sabem fazer, jogar futebol.

– O que nós precisamos é só dar suporte para que os nossos jovens, os nossos meninos possam fazer aquilo que eles mais sabem fazer, jogar futebol. A figura do Ronaldo já seria uma figura representativa do futebol brasileiro. Porque o Ronaldo, mundialmente, é o Ronaldo. Então, onde o Ronaldo for, as portas vão se abrir. O que nós queremos é exatamente isso, que ele resgate novamente, faça com que as pessoas voltem a respeitar o futebol brasileiro.

Cafu acha que Seleção é refém do futebol de Neymar

Marcos Ribolli

Você gostaria de ver o Guardiola como técnico para a seleção ou você segue o raciocínio de que precisa ser um treinador brasileiro?

– Eu sigo o raciocínio de que precisa ser um treinador brasileiro. Nada contra os treinadores estrangeiros, pelo amor de Deus. Mas eu acho que o Brasil merece ganhar uma outra Copa do Mundo novamente com um treinador brasileiro. Nós sempre tivemos referências com treinadores brasileiros.

– Sempre tivemos ótimos treinadores brasileiros, treinadores que foram vencedores, treinadores que não ganharam. Nós tivemos treinadores como 82 e 86, com o próprio Telê Santana, com uma Seleção fantástica que acabou não conseguindo resultado. Como nós tivemos treinadores como Parreira e Felipão, que foram campeões do mundo. Então, nós temos hoje bons treinadores. O que nós precisamos fazer é dar tranquilidade para que esses treinadores possam trabalhar. Por quê? Quando vocês falam de treinador, eu falo, olha, eu prefiro um brasileiro.

– Se vocês me trouxerem o Guardiola, Abel, Jorge Jesus, o Ancelotti ou qualquer outro treinador para a seleção brasileira, vocês vão dar, no mínimo, quatro anos para ele. Vocês não vão contratar esses treinadores depois de 2026 e mandar embora depois de um ano se perder quatro, cinco jogos nas eliminatórias, vai? Não vão mandar, porque é um estrangeiro. Então, não manda o brasileiro. Então, dê capacidade, qualidade e tranquilidade para o nosso treinador brasileiro trabalhar. Você vai ver o que ele é capaz de fazer. Porque no Brasil, se você perde três jogos nas Eliminatórias, já não serve mais.

– Já estão contestando o trabalho do Dorival. Tem muita gente, um ano e meio antes da Copa do Mundo, falando que o Dorival tem que sair. Mas, vocês iriam fazer isso com um treinador estrangeiro? Não. Então, dê tranquilidade para os nossos treinadores. Fazer assim, nós vamos começar a programação de 2026 com o Dorival novamente? Porque o Dorival, hoje, é o atual treinador. Então, tá. Nós vamos dar para o Dorival quatro anos para ele formar um time. Para ele formar uma Seleção. Para ele dar uma identidade para a seleção brasileira. Para ele formar uma seleção brasileira. Para ele formar um padrão técnico e tático para a seleção brasileira. Nós vamos voar.

– Os jogadores vão jogar por música. Você vai entrosar esses jogadores. Agora, se em quatro anos você tem quatro treinadores diferentes, é impossível você ter uma Seleção que vai jogar por música. Eu fiquei 16 anos na seleção brasileira. Dos 16 anos, joguei 12. Com o Roberto Carlos, com o Ronaldo, com o Rivaldo, com o Ronaldinho, com o Lúcio, com o Roque Júnior, com o Dida, com o Marcos.

O Tite ficou seis anos à frente da seleção, e ainda assim a gente não conseguiu passar das quartas de final. O que você entende que está faltando?

– Lembra que depois de 70, nós ficamos 24 anos sem conquistar título. E passamos com grandes jogadores na seleção brasileira também, com grandes treinadores que repetiram algumas Copas. Eu sempre costumo falar, sempre que existe uma derrota dentro de uma seleção brasileira, o maior culpado somos nós, os jogadores. O treinador, ele tem o esquema tático, ele tem o seu percentual de culpa, mas a maioria das vezes o culpado somos nós, porque somos nós que entramos dentro de campo. Você falou bem, o Tite ficou seis anos, não conseguiu um título, outros treinadores ficaram também oito anos e não conquistaram o título.

– Ser campeão do mundo não é fácil. Ganhar uma Copa do Mundo não é fácil. É que depois de 70, nós ficamos aí três finais de Copa do Mundo consecutivas, o Brasil tendo os melhores jogadores da história do futebol. Passaram pelo Brasil, tanto é que nós tivemos cinco jogadores escolhidos como o melhor do mundo durante esse período. Nós passamos um período que a maioria dos nossos jogadores não foram mais escolhidos como o melhor do mundo. Tivemos agora o Vini Jr. (2024) depois do Kaká (2007), depois de muito tempo.

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Marcos Ribolli

Qual a sua visão da safra de jogadores que o Brasil tem hoje?

– Olha, uma das maiores discussões nossas é quando eles falam de gerações. Eu dou risada até para responder essa pergunta. Se você pega, por exemplo, 1970, quando o Brasil foi campeão, nós tínhamos uma geração que era impressionante, de número 10. Nós tínhamos cinco número 10 jogando. Nós tínhamos Rivellino, nós tínhamos Gerson, nós tínhamos Tostão, nós tínhamos Pelé, nós tínhamos Clodoaldo. Cara, olha a geração que nós tínhamos. Foi uma geração vencedora.

– Passamos 24 anos sem conquistar título com uma geração fantástica. A geração depois de 70 era uma geração fantástica. Depois de 70, conquistou em 94. Depois de 94, nós passamos uma geração voando até 2006, por exemplo, com os maiores e melhores jogadores da história do futebol. Em 2002, a seleção brasileira ganhou a Copa do Mundo jogando no fino do futebol, num momento que ninguém acreditava. Uma geração vencedora. A geração que nós temos agora, você não pode comparar com a de 70, com a de 94, você não pode comparar com a de 2002, que foi campeã do mundo. É uma ótima geração, tem excelentes jogadores. Nós temos uma mina de diamante na mão, que são esses jovens jogadores nossos, que precisam ser lapidados.

– Mas para você lapidar um diamante, precisa ter cuidado, porque se você for muito afoito, você acaba destruindo esse diamante. Para que uma geração possa se tornar vitoriosa, ela precisa ganhar uma Copa do Mundo. Basta ganhar uma Copa do Mundo, parece muito simples, você ganha uma Copa do Mundo, você fala com a geração que ganhou a Copa do Mundo. Qual foi a geração? Foi a geração do Raphinha, do Neymar, do Vini, do Estêvão, do Endrick.

– Uma Copa do Mundo muda toda a história de uma geração. Então, é uma geração boa, pode se transformar em excelente se ganhar a Copa do Mundo. Não tem como comparar com a nossa, porque fizemos história e vai ficar marcado pro resto da vida quando se falar de Copa do Mundo. A gente espera que essa geração que vem agora também possa fazer o mesmo.

Você acha que o Brasil ficou refém do Neymar nos últimos anos?

– Acho não, tenho certeza. Nós ficamos durante quase 14 anos dependentes de um único jogador. Nosso maior jogador, nosso maior ídolo, aquele que nós sabemos que a qualquer momento poderia resolver o problema. Me fala, qual que é o ídolo nacional hoje, depois do Neymar, no absoluto, mundial? Depois do Neymar nós não tivemos um ídolo. O Neymar foi o nosso último ídolo. E durante 14 anos nós ficamos dependentes do que o Neymar fazia.

– E a gente sabe que se você ficar dependente de um único jogador, você não vai ganhar uma Copa do Mundo. É impossível. Você não ganha a Copa do Mundo dependendo de um único jogador. Eu costumo falar, como você comparou de 2002, vamos lá. Em 2002 você tinha o Ronaldo, se o Ronaldo tivesse mal, o Rivaldo resolvia. Se o Rivaldo tivesse mal, o Ronaldinho Gaúcho resolvia. Se o Ronaldinho Gaúcho tivesse mal, o Roberto Carlos resolvia numa falta.

– Se o Roberto Carlos, o Ronaldinho Gaúcho, o Rivaldo e o Ronaldo tivessem mal, em uma bola parada, o Roque Júnior, o Lúcio ou o Edmilson faziam gol de cabeça. Nós tínhamos muitas opções para que você pudesse ganhar um jogo. E você viu que em nenhum desses momentos eu falei de um único jogador que poderia resolver. Eu falei de um time, que jogava para um time, que jogava para todo mundo, que qualquer um deles poderia resolver o jogo a qualquer momento.

Cafu em entrevista ao Abre Aspas

Marcos Ribolli

– Acabou. Qualquer um resolvia. Mas nós passamos durante esses 14 anos dependendo do Neymar. Para bater falta, para bater escanteio, para brigar com o juiz, para brigar com o treinador, para brigar com o torcedor, para brigar com os adversários, para escolher o campo ou bola. Nós ficamos durante 14 anos dependendo só desse único jogador. E chamava responsabilidade sozinho. E quando se fala de seleção brasileira não existe responsabilidade sozinho. Ninguém ganha título sozinho. Não ganha. Ele não ia ganhar sozinho. Ele ia ganhar se ele tivesse o time todo jogando para ele. Ficaria mais fácil.

Você acha que para 2026 a gente chega com essa responsabilidade um pouco mais distribuída?

– Hoje eu vejo mais distribuída. Hoje temos jogadores que podem chamar a responsabilidade. Jogadores campeões pelos seus clubes. Nós temos o Rodrygo, que é um cara que chama a responsabilidade. Nós temos o Vini Jr., o Raphinha... Nós temos o Marquinhos que é um zagueiro que sempre chama a responsabilidade. Temos ótimos goleiros que podem chamar a responsabilidade. Eu acho que hoje está mais dividido.

– O Neymar se encaixaria muito bem. Esse elenco poderia dar suporte para ele. Mas aí depende da maneira que você vai fazer esses caras jogarem. Dar responsabilidade para eles. Hoje eu vejo alguém que possa dar um suporte de igual para igual um dos melhores jogadores que nós tivemos na história durante esses 14 anos que foi o Neymar.

E o que aconteceu em 2006? A Seleção tinha qualidade e não venceu.

– Em 2006 foi detalhe. A gente só perde uma Copa do Mundo por detalhes. Se você parar e prestar atenção, em todas as Copas que nós perdemos foi assim. Em 2006 foi um detalhe. Uma bola parada, uma falta de atenção e nós perdemos o jogo. Se passa da França naquele jogo de repente o Brasil seria campeão. Por um detalhe nós saímos fora.

– Nós cometemos um erro contra a França e saímos fora. Eu acho que é mais uma questão de detalhes. Você pode ter astros, você pode ter 10 jogadores melhores do mundo num time, mas um simples detalhe e você acaba não ganhando o jogo. Nós tivemos 82. A maior resposta para a sua pergunta é 82. Nós tivemos a maior seleção da história do futebol considerada por todos. O Dream Team do futebol brasileiro. Um detalhe nós saímos fora. Em 2006 um detalhe nós saímos fora, também.

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E a realidade da sua posição, Cafu?

– Eu só não vou citar nomes, mas vejo o momento da lateral direita fácil de resolver. Nós tivemos aí por um bom tempo o Danilo, que estava jogando como zagueiro na Juventus, no futebol europeu que é completamente diferente daquilo que ele fazia aqui no Brasil como lateral-direito. E aí você via as dificuldades que ele tinha de se adaptar novamente na lateral e fazer a função devido aos anos que ele vem jogando como terceiro zagueiro que é uma função completamente diferente.

– Mas vejo com bons olhos os grandes laterais para a seleção brasileira. O que não pode é comparar. Se você for comparar os laterais de hoje com o Cafu, Daniel Alves, Roberto Carlos, Marcelo... foram jogadores que fizeram história no futebol mundial, na própria Seleção e no futebol brasileiro. O que nós precisamos dar para os nossos laterais é tranquilidade para que eles possam trabalhar e não comparar.

– Porque não dá para fazer essa comparação, o que eu preciso é que meus laterais tenham personalidade. Quando entrar na Seleção e jogar como lateral fazer a função que eles vêm fazendo no clube. Porque o lateral só é convocado para a Seleção baseado naquilo que ele faz no clube, então se ele faz aquilo no clube, tem que fazer na Seleção.

Cafu, ex-lateral e pentacampeão mundial com o Brasil

Marcos Ribolli

E sobre a formação de capitães, acha que falta isso na Seleção?

– Cara, a liderança faltava. Isso é fato. Isso foi nítido. Nítido, nítido. Um dos nossos comentários nas nossas rodas de apoio ao futebol brasileiro é exatamente sobre isso. É a falta de liderança. Existem dois tipos de líder. O líder que é respeitado, e o líder que é temido. Eu sempre quis ser um líder respeitado. Um líder respeitado é o que se faz respeitar. O primeiro a chegar, o último a sair. O líder é o elo. O líder tem que ser o elo entre o jogador e o treinador. Entre o treinador e a imprensa. Entre o treinador e a família. Entre o jogador e o adversário. O líder é uma espécie de elo, o cara que dentro de campo fala assim: "Gente, calma, vamos fazer dessa maneira, vamos resolver esse tipo de problema". O líder é o cara que vai colocar o dedo na cara de qualquer jogador e falar: "Você está errado, se for dessa maneira nós não vamos ganhar". Eu não vejo isso hoje em um jogador da seleção brasileira.

– Talvez hoje o Raphinha esteja mais preparado para isso, porque é o capitão do Barcelona. Ele vem liderando o Barcelona com grandes jogadores. Eu vejo isso. Mas durante um bom tempo eu acho que nós não tivemos esse líder que realmente discutia com os caras dentro de campo e os caras sabiam que ele estava discutindo por um propósito bacana. Que queria ganhar um jogo. Como foi o Dunga com o Bebeto em 98 que eu tive que separar, que os dois quase se pegaram. Eu falei, opa, o que está acontecendo aí com os dois? Era a vontade de ganhar. Mas sempre existia o respeito entre os dois.

– Mas durante um bom tempo nós vimos que isso faltava um pouco na seleção brasileira. Durante um bom tempo a gente via jogar por jogar, ninguém assume a responsabilidade, ninguém quer ser o líder. O capitão não é só pra escolher o lado do campo ou escolher a bola. O capitão é o cara que vai chamar o time como segundo treinador. Porque dentro de campo é o capitão que vai mudar as ordens. Colocar o time pra correr, ver o que está certo ver o que está errado, vai chamar a responsabilidade. A gente costuma falar, o capitão não precisa ser o melhor jogador do time.

– Era nítido na seleção brasileira que faltava uma liderança. Eu vi outro dia, eu não costumo comentar mas eu vou comentar, do Danilo que foi discutir com um torcedor depois de um jogo da Seleção. Ele é o meu capitão. Ele é o meu líder. Ele é a minha referência. É o cara que fala, gente, o torcedor está no direito dele, jogamos bem ou mal, o torcedor vai estar aí. Se eu jogar bem, ele vai me aplaudir. Se eu jogar mal, ele vai me vaiar. Já me vaiaram no Maracanã, 120 mil pessoas me vaiando, mandando eu plantar chuchu. O cara está no direito, está jogando mal, quando eu jogar bem eles vão me aplaudir. É esse o equilíbrio que o capitão tem que ter dentro de campo, para passar para os outros meninos.

Cafu, você falou grupo de apoio, grupo de discussão do futebol brasileiro, o que seria isso?

– Nós temos um grupo de WhatsApp de jogadores que discutem o futebol brasileiro e o futebol mundial. O que pode melhorar, o que não pode melhorar, o que deve fazer, o que não deve fazer. A gente discute muito em relação a isso, a gente gosta de discutir isso, sempre no lado positivo. A gente nunca discute no nosso grupo um lado negativo, é sempre tentando melhorar alguma coisa, principalmente do futebol brasileiro.

E é grupo sério, sem corrente, figurinha, meme?

– Nada de meme, nada de figurinha, principalmente quando tem jogo. Eu fiz parte muito tempo da Fifa, da comissão que discutia toda a mudança no futebol brasileiro, regulamentos a gente discutia na nossa comissão. Então, tudo que era mudança do futebol brasileiro tinha que passar por nossa comissão. Nós dávamos palpite em relação ao que poderia mudar no futebol mundial. Então, quer dizer, era uma coisa muito séria. Então, a terceira substituição, a quarta substituição, lateral com o pé, que era uma que estava em nossa pauta também. Então, a gente gosta de discutir coisa séria em benefício do futebol. A gente nunca discute coisa que vai te trazer algo negativo para o futebol.

Cafu, ex-lateral e pentacampeão mundial com o Brasil

Marcos Ribolli

E quem que está nesse grupo?

Bastante gente. O da Fifa estava o Hierro [ex-zagueiro espanhol], estava o Colina [ex-árbitro], eu, o Raul [ex-atacante espanhol], estavam dois médicos, tinha bastante gente, gente importante da Fifa. O nosso aqui é gente nossa do Brasil.

A galera do penta, vocês se conversam, tem um grupo no Whatsapp de vocês?

Tem, tem do penta, do tetra, da Roma, do Milan, do Zaragoza, tem todos. O do penta é o mais ativo.

E as histórias que o Vampeta conta, são verdade mesmo ou 90% é mentira?

– Não, 90% é mentira. Mas ele conta muita coisa bacana. Algumas ele aumenta, mas o Vampeta é o cara que tem uma memória impressionante. Eu não guardo um terço do que ele guarda, eu não consigo guardar. Se eu não escrever, eu esqueço. Ele lembra de tudo, cara, é impressionante. Mas torce, viu? Torce, torce muito pela seleção brasileira.

O pessoal do penta se encontra, faz churrasco?

– Então, quando faz jogos corporativos, praticamente, no mínimo dez pentacampeões estão juntos. Então, quase que duas vezes por mês, três vezes por mês, ele está se reunindo, está juntando todo mundo.

E a ausência dos jogadores do penta no velório do Pelé? Isso repercutiu entre vocês?

– Então, cara, cada um tinha o seu problema. Cada um estava em um lugar diferente do mundo. Tanto é que no velório do Zagallo eu vi poucas pessoas. Aliás, eu não vi quase ninguém. E poucas pessoas comentaram do Zagallo, que tem quase o mesmo peso que o Pelé, se você falar historicamente na seleção brasileira. Infelizmente, alguns puderam ir, outros não puderam ir. Eles só fizeram uma polêmica muito grande em cima da morte de uma pessoa, que é muito chato. Tanto é que na missa do sétimo dia do Pelé, eu estava lá, porque eu estava no Brasil. Consegui os meus voos, consegui voltar. Em outra ocasião, não consegui voltar e não consegui o meu voo. Então, sem polêmica. Vai ser o Pelé eterno, vai ser glorificado para sempre, nossa maior referência, nosso maior jogador. Vida que segue.

Cafu brinca sobre histórias contadas por Vampeta

Marcos Ribolli

Como enxerga a luta do Vini Jr. contra o racismo e como você enfrentou isso, principalmente atuando fora do Brasil?

– O racismo é cultural. Para mim é uma questão de educação. A criança é um papagaio. Ela repete aquilo que nós falamos. Então é uma questão educacional. Educa-se uma criança, ela vai viver numa sociedade de igual para igual com todo mundo, independentemente da sua cor, da sua raça, das suas condições financeiras ou do que você é. É claro que é chato quando você vê o que fizeram com o Vini Jr. É uma situação completamente delicada. Negro, saiu da favela, pobre, que conquistou o mundo. Que de uma hora para outro mundo estava nos seus pés. Quando se fala de racismo dos outros países, nós temos que ver o nosso também.

– O racismo não é só lá fora. Nós temos também no nosso país. Nós temos que combater os nossos aqui também. Antes de falar do país dos outros, acho que o mais importante é a mensagem que o Vini passou. Nós podemos combater e vamos combater. Mas para combater nós temos que estar juntos. Temos que ser fortes, temos que nos unir para que nós possamos realmente combater isso que é uma praga mundial. Não é só de determinado país. Existe no mundo inteiro e a gente espera que isso não acontecesse, mas acabou acontecendo no futebol.

– Mas o futebol ainda tem uma força muito grande para combater o racismo. E nós estamos fazendo isso. O Vini está fazendo isso. A Fifa está fazendo isso. A CBF está fazendo isso. As instituições estão fazendo. A gente espera que isso acabe. A gente achava que isso poderia acabar um dia, mas está longe de acabar.

Tem um time que você consegue elencar que foi o que você mais gostou de jogar?

– O time de São Paulo 92, 93, era incrível. O Palmeiras de 96, 97 era impressionante. O Milan de 2005, 2007 brincava. A Roma de 2001, cara, era impressionante. Todos os times que eu passei, é difícil eu falar para você, esse foi melhor do que aquele. Porque todos eu tive a oportunidade de conquistar título. Todos jogaram para caramba. Eu fui tão feliz, cara, porque eu joguei com os maiores jogadores do mundo. Todos os times que eu passei, eu joguei com os maiores jogadores da história do futebol. Impressionante. Então, eu sou um cara muito privilegiado. Não dá para falar esse time foi melhor do que aquele. Não vamos falar de time, então vamos falar onde você jogou mais bola.

Qual foi o seu grande momento, Cafu?

– O começo no São Paulo, sem dúvida nenhuma, 92, 93, foi um momento que eu estava me projetando para o mundo. Eu tinha uma carreira internacional. Mas eu falo do Milan porque eu cheguei no Milan com 33 anos. Eu falei, pô, você me quer com 33 anos no Milan? É isso mesmo, a gente quer você mesmo com 33 anos. Fiquei cinco anos no Milan, de 2003 a 2007, eu voava. Com 36 anos, então, o finalzinho foi incrível. O físico estava ótimo, por incrível que pareça. Eu saí do Milan porque eu quis. Eles me chamaram para renovar em 2008, falei que eu queria voltar para casa para ficar com meus pais. E voltei em 2006, eu estava com o físico voando, dava para jogar tranquilo, quis voltar para casa.

Ao que você atribui seu condicionamento físico tão bom, Cafu?

– Ele me deu esse dom e eu aperfeiçoei. Porque eu sempre quis treinar. Eu sempre quis treinar mais daquilo que eu sabia que eu precisava. Então, se o treinador pedia para dar 10 voltas em campo, eu dava 15. Eu precisava de um gás a mais, lateral. Quando todo mundo estiver cansado, eu vou estar voando. Então, no Milan, por exemplo, eu fazia trabalho específico.

– Uma pista de areia do lado de campo e uma subida de quase 100 metros, porque eu sabia que eu ia precisar, e o diferencial meu seria praticamente isso. Quando todo mundo estivesse cansado, eu ia estar pleno no campo voando. Dava para dar um gás a mais, 15 minutos a mais, 10 minutos a mais. Era o momento que eu precisava. Então, além de eu ter um bom condicionamento físico, eu trabalhei para que esse condicionamento físico fosse excelente.

Você sempre se alimentou bem?

– Cara, eu comia o que tinha na concentração, nada fora do normal. Sempre fui de comer normal. Só não como camarão porque sou alérgico, fora isso eu comia de tudo. Mas eu queimava muito nos treinos também. Eu me dedicava muito no treinamento e musculação, isso me ajudou muito, principalmente musculação. Eu fazia musculação antes do treino e depois do treino. Não tinha preguiça, sabia que se eu fortalecesse as pernas eu ia estar bem, que era o que eu precisava. Porque uma vez o Careca me falou uma frase que me marcou. Ele falou, o maior investimento que você pode fazer é em você mesmo. E o atleta, o maior investimento que ele pode fazer é nele mesmo.

Você mantém uma rotina de exercício? Como é?

– Eu gosto de treinar. Se eu pudesse, eu dava uma corridinha todo dia. Passava na academia. Como eu faço muito jogo corporativo, faço muito evento corporativo e no término desse evento, acaba com um jogo de futebol, você acaba se movimentando. E aí eu passo na musculação, corro, treino, gosto de treinar, não tenho preguiça de levantar cedo para treinar, aí acabo mantendo o condicionamento bom.

Cafu, ex-lateral e pentacampeão mundial com o Brasil

Marcos Ribolli

Você acha que o Ancelotti é um cara que se encaixaria no perfil aqui no Brasil?

– Eu acho que sim. O Ancelotti eu estive com ele cinco anos. É um treinador excepcional. Sabe gerenciar crise. E olha que ele teve Rivaldo, Redondo, Rui Costa, Seedorf, Kaká e Ambrosini no meio e podia jogar dois. Como é que você vai fazer a gestão disso? Difícil e ele sabia fazer a gestão de uma maneira muito simples. O meu time é esse, o resto vamos ver se a gente consegue encaixar. E todo mundo é respeitado, porque todo mundo sabia que a qualquer momento podia jogar.

– Isso fazia os outros treinar mais ainda. Se der brecha, o outro entra. Então a gestão que ele faz é incrível. Sem contar a capacidade que ele tem de ler jogos. E ele se tiver de tirar no intervalo, ele tira. Antes do intervalo eu tiro porque eu sei que eu vou ganhar o jogo. Então o Ancelotti tem essa leitura bacana. Sem contar a capacidade e a competência dele.

E parece que sabe lidar com jogadores brasileiros...

– No Milan nós tivemos Kaká, Serginho, Dida, eu, Amoroso... aí depois teve Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo, Pato aí depois o Gilberto Silva jogou, Thiago Silva pouco tempo. Então o Serginho voava, a Dida voava. Eu estava voando do lado de cá. O Kaká, o melhor do mundo. Então ele gosta de trabalhar com brasileiros porque ele sabe que os brasileiros gostam de trabalhar.

O que foi determinante para a derrota em 2006?

– Eu costumo falar que determinante é a falta de capacidade nossa de ganhar o jogo, porque Weggis (cidade na Suíça onde foi a preparação) não entra dentro de campo. Dentro de campo somos nós. É certo que não foi uma preparação como nós tínhamos feito das outras vezes, 100% concentrados, não foi aquilo que fez com que a gente perdesse para a França. Não ganhamos dentro de campo, seria muito fácil vir aqui, poderia inventar toda desculpa do mundo para vocês. A preparação não foi legal, estava muita bagunça, o jogador não estava concentrado, mas quando entra dentro de campo não tem bagunça, quando entra não tem bagunça, não tem concentração, somos nós.

Para muita gente é difícil explicar como aquele grupo fantástico não conseguiu o título, né Cafu?

– Simples, como em 82 não conseguiu e não estava bagunçado. A gente podia inventar qualquer desculpa do mundo, 82 estava tudo perfeito, todo mundo concentrou bonitinho, tinha o melhor time da história, não ganhou. Em 2006 tinha, depois de 2002, uma das melhores seleções tecnicamente, e não ganhou. Quando o resultado é negativo, você começa a procurar pretextos. E não deu certo porque nós não fomos capazes de ganhar, não tivemos a capacidade de ganhar da França.

Cafu, qual foi o maior talento que você viu, que você jogou junto e qual foi o maior desperdício?

– Ronaldinho Gaúcho. O Ronaldinho Gaúcho pra mim foi um dos melhores, um dos melhores que eu joguei a favor e foi um dos piores que eu tive que marcar. O Ronaldinho Gaúcho tinha um talento, ele era muito natural, ele não fazia força para driblar, não fazia força pra sair do marcador, não fazia força pra fazer gol. Ele brincava com a bola, parecia tudo natural. Talvez tenha sido um desperdício ele ter parado tão cedo, ele se enquadra nessas duas funções.

– Eu falei pra ele: você já vai parar de jogar? Você tem um talento que não tem ideia, a gente precisa de você e ele parou cedo. Teve aí três anos e meio mais ou menos, que foi o ápice dele. No Barcelona, ele destruiu. O que ele fez nunca vi jogador nenhum fazer, nenhum. E olha que falei que joguei com os maiores jogadores da história, e o Ronaldinho é um deles. O que esse menino fez, de quando ele começou no primeiro jogo dele lá na Copa América naquele gol, ele fez o chapéu e fez o gol na estreia, até o gol de bicicleta, dando três chapéus, então pra mim foi o Ronaldinho.

– O Ronaldinho é incrível, nunca vi tecnicamente, taticamente o poder de driblar de tirar o adversário, o raciocínio dele era impressionante, a linha de raciocínio dele era incrível. Quando você achava que ele ia fazer uma coisa fazia outra, quando você olhava pra ele tava dando gol e ele não driblava por driblar, driblava saindo para o gol, para mim foi um dos maiores.

Dá pra colocar o Adriano Imperador nessa lista?

– O Imperador poderia. Outro dia encontrei ele e falei: Adriano, você tem noção de quem é você em Milão? Você desce do aeroporto e os caras falam, o Imperador chegou, você tem noção do que é isso? Esse talento que você tinha é incrível, canhoto, forte, habilidoso, só não conseguia ganhar de mim, falava pra ele. Dava uma pancada, mas parou muito cedo muito cedo. Ele falou: "Sabe o que eu quero? Ficar de chinelo, bermuda, ir lá na minha comunidade e fazer o que quero". Deus abençoe, vai fazer o que você quer, mas para nós foi um desperdício de futebol.

Dá pra eleger quem foi o melhor treinador que você trabalhou?

– Telê Santana, campeão com tudo em São Paulo. Luxemburgo, campeão no Palmeiras naquele ataque dos 102 gols que o time jogava voando. O Ancelotti em cinco anos, 10 títulos, não tem o que falar. Felipão, campeão do mundo, só isso. Como é que você compara esses quatro treinadores? Foram quatro treinadores vencedores e desses treinadores a gente aprendeu muito, principalmente eu que sou curioso e gosto de aprender. Cada um deles ensina uma coisa diferente quando você quer realmente aprender, são treinadores que têm valores, que fizeram história por onde passaram.

Você fez inimigos na carreira?

– Por incrível que pareça, não. Sempre fui muito correto dentro de campo, mesmo quando fazia falta eu ia lá, pegava na mão, levantava. Sempre fui muito de respeitar as pessoas, levava o meu trabalho a sério, era muito chato em relação a isso, a seriedade, o compromisso do futebol mas graças a Deus, acho que eu nunca fiz inimigo no futebol. Tenho grandes amigos, é óbvio que você nunca vai agradar todo mundo, mas nunca procurei desagradar ninguém.

Cafu, ex-lateral e pentacampeão mundial com o Brasil

Marcos Ribolli

Ainda tem algo que você sonha ter?

– Tive o privilégio de ter uma carreira fantástica, agradeço a Deus todo dia a oportunidade que ele me deu. Acho que poucos jogadores conseguiram fazer o que fiz, são poucos que vão conseguir fazer. Disputar três finais de Copa do Mundo consecutivas, garoto simples, humilde, morador do Jardim Irene, pobre, que foi mandado embora nove vezes, que as pessoas falaram que jamais seria um jogador de futebol.

– Não só fui um jogador de futebol como fui campeão do mundo, não só fui campeão do mundo como fui o capitão da seleção brasileira, não só fui capitão da seleção brasileira como fui um jogador na história do futebol disputar três finais de Copa do Mundo consecutivas. Então, quando olho pra frente o que é que eu desejo do mundo? Um mundo melhor, sem desigualdade.

– E o futebol tem capacidade de fazer isso. O futebol tem capacidade de mudar a história do mundo, principalmente do racismo. É a maior ferramenta de inclusão social que existe. O futebol fala com todos os idiomas, com todas as raças, com o preto, fala com o branco, rico fala com o pobre, o chinês fala com o americano, brasileiro fala com o paraguaio, o argentino fala com o libanês. É incrível o poder do futebol. O que eu queria era isso, um mundo sem desigualdade.

Ge

Globoesporte.com

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