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Esporte

As cadeiras vazias e a seleção ansiosa

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Em qualquer circunstância, um encontro entre Brasil e Uruguai já é suficiente para gerar expectativas. Mas aspectos futebolísticos à parte, a noite de terça-feira na Fonte Nova era carregada de simbolismos. Na véspera do feriado nacional pelo Dia da Consciência Negra, a cidade com a maior população preta fora da África receberia uma seleção que tem em Vinícius Júnior, símbolo da luta contra o racismo, um de seus nomes mais destacados.

Salvador, palco de lutas sociais tão importantes na histórica do país, expressão viva da cultura afro-brasileira manifestada em cada esquina da capital baiana, era o cenário de um jogo marcado por ações antirracistas realizadas antes e durante a entrada dos times em campo. Uma jornada pela igualdade, pela inclusão.

Mosaico da Seleção em homenagem ao Dia da Consciência Negra

Rafael Teles

Mas para estar na festa, era preciso gastar, no mínimo, R$ 200 pelo ingresso mais barato – ou R$ 100 na meia entrada, não acessível a todos. Ou seja, as ações afirmativas cessam quando começa a busca pelo lucro. As 8 mil cadeiras vazias, ao menos de acordo com números oficiais – o visual do estádio indicava uma ocupação ainda menor-, retratavam o oposto: uma jornada de exclusão. Uma parcela da sociedade baiana e brasileira não tinha lugar na festa, justamente a parcela que melhor representa as lutas que os organizadores diziam defender. A representatividade ficou no discurso.

Importa pouco o argumento da CBF de que a operação da venda de ingressos fora entregue a terceiros, aí incluída a fixação dos preços. Cabe à confederação zelar pela imagem da seleção e, principalmente, pela sua relação com a sociedade, pelas mensagens que um símbolo tão forte do futebol nacional transmite ao país. Ao não impor limites – algo que promete fazer de agora em diante -, a CBF permitiu que a seleção vivesse, num momento em que busca afirmação, o constrangimento de jogar para milhares de assentos vazios. O anel intermediário do estádio, um dos mais caros, ficou quase todo desocupado em seus setores localizados do lado oposto às câmeras de TV. O símbolo da ganância dos organizadores exposto em rede nacional.

É ainda mais curioso notar que o técnico da seleção, Dorival Júnior, recorre repetidamente à tese de que é preciso "reaproximar a seleção do povo". Decididamente, a CBF não o ajudou na empreitada.

Em campo, foi como se a atual escola brasileira de futebol estivesse simbolizada, com suas virtudes e defeitos. A escalação que iniciou o jogo, e ainda mais fortemente a que terminou, exibiam uma fartura de atacantes, quase todos eles formados como pontas velozes e dribladores. No entanto, há muitos momentos em que o time expressa a dificuldade de ditar ritmo, porque são restritas as opções de meio-campistas que comandem o jogo.

Das características dos jogadores à sufocante pressão de uma seleção brasileira que se renova, lança mão de jovens e convive com a cobrança por vezes insana por um título mundial, o que se vê é um time ansioso. Contra o Uruguai, os primeiros minutos mostraram bons movimentos, um plano para lidar com a marcação individual do time de Marcelo Bielsa. Mas a sensação é de que, gradativamente, as características dos quatro homens ofensivos se impõem: a seleção acelera demais, é apressada, até terminar se partindo entre os que atacam e os que defendem. O time acumula atacantes na linha defensiva adversária e tenta lançar bolas às costas dos defensores. E pior, acaba permitindo um jogo de idas e vindas, golpes e contragolpes, sem que esteja equilibrada para defender. O Brasil sempre pareceu frágil sem bola, sacrificando demais seus dois meio-campistas.

Analisados isoladamente os 90 minutos, o Brasil até produziu para vencer. Não foi um desastre, um jogo para se descartar. Mas a forma como o time parece depender de espaços para acelerar, a falta de mais articulação é algo que merece atenção. No segundo tempo, Dorival empilhou homens de frente, Raphinha foi parar na lateral esquerda – de onde partia para virar um ala. O Brasil chegou a ter cinco atacantes juntos, mas quase nenhum deles parecia ter clareza da função a executar ou do espaço a ocupar. O time até teve volume, mas acabou tendo menos ordem.

Não é justo dizer que nada se aproveita de 2024. Tampouco é correto deixar de ponderar que, a cada convocação, quase metade do elenco é composto por jogadores que sequer estavam entre os 26 do último Mundial. O trabalho de Dorival não é simples. No entanto, os progressos foram mais tímidos do que o desejável.

Ge

Globoesporte.com

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