Esse é o maior valor já pedido em ação climática. Advocacia passou a individualizar e quantificar a infração ambiental que resultou diretamente nas emissões de gases do efeito estufa. Outras nove ações já foram apresentadas. A Advocacia-Geral da União (AGU) acionou nesta segunda-feira (11) a Justiça Federal do Distrito Federal para cobrar R$ 292 milhões de um pecuarista para garantir a compensação financeira por danos climáticos causados pela destruição da Amazônia.
É o maior valor já pedido pela AGU em ação climática – outras nove já foram apresentadas à Justiça com valores bem inferiores. A chamada "ação por dano climático" ainda é pouco utilizada no país. Normalmente, as ações ambientais requerem recuperação da área desmatada e o pagamento de danos morais coletivos em razão dos danos causados ao meio ambiente.
Agora, a AGU tem ido além. O órgão está identificando individualmente cada infração ambiental que resultou diretamente nas emissões dos gases poluentes e que , consequentemente, contribuíram para agravar a emergência climática.
O alvo da ação é Dirceu Kruger, pecuarista autuado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por ter desmatado e queimado 5,6 mil hectares da Floresta Amazônica entre 2003 e 2016.
A AGU aponta que as infrações ambientais representaram a emissão de 901 mil toneladas de gases do efeito estufa.
Segundo a AGU, os valores devem ser destinados ao Fundo Nacional Sobre Mudança do Clima (FNMC). O cálculo é feito em cima de índices da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – segundo o qual cada tonelada de carbono custa 60, ou R$ 324 considerando cotação do euro comercial a R$ 5,40.
De acordo com as investigações, as áreas afetadas estão localizadas em terras públicas da União e do Estado do Amazonas nos municípios de Boca do Acre (AM) e Lábrea (AM). A AGU afirma que Kruger utilizou motosserras para suprimir a vegetação, posteriormente efetuou queimadas para limpar o terreno e, por fim, plantou capim com o objetivo de estabelecer pastagem para criação de gado.
A ação traz laudos de vistorias do Ibama, imagens de satélite das áreas e até mesmo um vídeo em que Kruger confessa as atividades.
"O presente caso revela situação de dano climático perpetrada por infrator contumaz, plenamente ciente de sua conduta ilegal, indiferente aos prejuízos ambientais e climáticos intencionalmente provocados", diz a ação.
Para a AGU, o dano climático causado pela supressão e queimada da vegetação amazônica é duplo, uma vez que as atividades ilícitas não só emitiram gases do efeito estufa, como também removeram do meio ambiente plantas capazes de retirar carbono da atmosfera.
"A população brasileira, em especial a mais vulnerável, já sente na pele os efeitos da emergência climática que vivemos, com desastres naturais cada vez mais frequentes e intensos", disse o advogado-geral da União, Jorge Messias.
"Basta ver o drama enfrentado por moradores do Rio Grande do Sul nos últimos dias. Em um quadro como este, o Estado não pode se omitir. É nosso dever atuar não só para mitigar o problema, mas para responsabilizar de forma exemplar os que aceleraram o efeito estufa de forma ilícita e em benefício próprio, destruindo o meio ambiente ao arrepio da Constituição e da legislação brasileira", completou o minsitro.
A AGU pede para o infrator seja condenado a restituir o lucro que auferiu com a exploração ilegal do meio ambiente. Também é pleiteado que ele seja obrigado a implantar projetos de recuperação ambiental aprovados por órgãos ambientais e a reparar o dano causado não só pela emissão de gases, mas pela retirada do meio ambiente de vegetação capaz de absorver carbono da atmosfera, em valor que ainda deverá ser definido.
A AGU também pede à Justiça concessão de liminar para que os bens do infrator sejam bloqueados e ele seja impedido de comercializar imóveis, espécimes bovinos e produtos de agropecuária, bem como adquirir ou alugar equipamentos como motosserras e tratores ou, ainda, obter acesso a empréstimos e benefícios fiscais.
"As ações se pautam na mensuração do estoque de carbono afetado que levou a emissões ilegais e ilegítimas de carbono na atmosfera, assim como na mensuração de afetação dos sumidouros de carbono. A partir dessa mensuração, valora-se o dano climático com a correlação com o custo social do carbono", afirmou o procurador federal Marcelo Kokke, coordenador Nacional de Assuntos Estratégicos e Responsabilidade Civil da Procuradoria Federal Especializada junto ao Ibama e um dos responsáveis pela elaboração das teses utilizadas pela AGU.