Neidinha Suruí, ativista dos direitos dos indígenas, conta que após ser desenganada pelos médicos, iniciou um ritual indígena e três meses depois, ela estava gestante da Txai Suruí. Mãe de ativista indígena, Txai Suirí, Neidinha Suirí
Gabriel Uchida/ arquivo
Ativista, guerreira e exemplo para filha Txai Suruí. Neidinha Suruí relembra que antes de engravidar da primeira filha, fez vários tratamentos, mas foi desenganada pelos médicos. Dentro da aldeia, depois de receber tratamento indígena, feito por mulheres da etnia, ela pôde gerar a primeira filha.
Txai foi a única brasileira a falar na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em 2021 (COP26), da Organização das Nações Unidas (ONU).
Txai Suruí fala na abertura da COP26, em 1º de novembro de 2021
Reprodução/COP26
Neidinha lembra que, antes de contar a família do marido que não podia engravidar, buscou ajuda e tratamentos médicos de fertilidade fora da aldeia, mas não adiantou.
"Eu tinha sido desenganada por todos os médicos, eles diziam que eu não podia ter filhos. Fiz vários tratamentos e nenhum deu certo. Quando casei com o Almir, os pais dele e todo a aldeia me falaram que eu podia sim ter filhos. A mãe dele falou que ela ia fazer o meu tratamento", relembra.
A ativista conta que o ritual de tratamento de fertilidade consistiu em banhos naturais, bebida tradicional do povo indígena e muito fé, mas o resultado foi a resposta afirmativa da gestação.
"Passei pelo tratamento da aldeia deles. Ela me dava banho com ervas todos os dias e uma bebida do mato, tradicional. Depois desses três meses, eu engravidei da Txai", conta.
Neidinha relembra a emoção que sentiu quando recebeu o resultado positivo da gestação, já que a filha era muito esperada.
"Imagina, eu passei por todos tratamentos médicos possíveis para engravidar e nada. Quando descobri que estava grávida, fiquei muito feliz. Fiz questão de ir à minha ginecologista, que falou que não ia engravidar e falei que estava gestante. Ela desconfiou, mas o teste confirmou o bebê. O bebê tão esperado é a Txai", diz Neidinha.
Destino traçado desde o ventre
Neidinha conta que desde o início da gestação sempre lançou palavras do destino de liderança da filha
arquivo pessoal
As palavras de afirmação e o destino da, hoje, representante das causas indígenas na ONU, foram definidos por Neidinha desde o momento em que soube que havia gerado uma vida em seu ventre.
"Eu conversava com ela e dizia que ela seria uma grande líder, uma guerreira para mudar as coisas. O pai dela e a avó dela pegavam na minha barriga e sempre cantavam as músicas e contava as histórias da aldeia".
Neidinha conta que, ainda nos primeiros meses de vida da Txai, sempre a levou nas manifestações, reuniões e eventos das causas indígenas.
"Desde que nasceu, ela sempre foi para aldeia comigo. Eu trabalhava mais nas Uru-Eu-Wau-Wau e foi nela que a Txai esteve mais presente na infância, mas também na dela, a Lapetanha, do povo suruí. Os dois espaços em que ela mais viveu. Lembro da gente subindo o rio Guaporé, em um sol de rachar, para fazer as coisas com os familiares na aldeia", relembra.
Neidinha conta que, com cinco anos de idade, viu que, as palavras que dizia enquanto a filha estava em seu ventre, estavam sendo concretizadas.
"Txai tinha cinco anos e estávamos em uma manifestação para pedirmos por respeito aos direitos da criança indígena. Ela largou minha mão, subiu no palco, pegou o microfone e brigou pelos direitos das crianças indígenas. Com aquilo, eu fiquei admirada. Como um bebê podia ter tanta certeza do que falava. Foi incrível".
Desde criança, Txai acompanha a mãe na luta pelas causas indígenas
arquivo pessoal
Nedinha teve a segunda filha, a Walelasoepilimãn. Ambas cresceram no universo de lutas pelo direitos dos povos indígenas e além das filhas de sangue, Neidinha transbordou o amor materno à mais três filhos de coração.
"Eu sempre os levava para saber como é a nossa realidade. Eu sempre lutei muito por liberdade e eu ensinei isso para eles. Tenho um relacionamento de afeição com eles".
Legado de luta
Depois do discurso na ONU, Neidinha conta que a filha passou a ser alvo de ataques de ódio e como mãe, o instituto de proteção dobrou sobre a filha.
"Depois do discurso do presidente Bolsonaro, minha filha passou a ser vítima de ataques de ódio. Sempre a oriento para tomar cuidado, não sair pra rua sozinha".
Mãe de ativista indígena, Txai Suirí, Neidinha Suirí
arquivo pessoal
A visibilidade, hoje voltada para filha, não é novidade na vida de Neidinha. Ela conta que sempre sofreu ameaças e por isso precisou de proteção. A filha, mesmo pequena, teve a guarda da Polícia Nacional, mesmo quando ia para escola.
“Eu e o pai dela sempre fomos ameaçados de morte. Txai precisou da escolta policial para ir para escola. Ela era muito pequena e não entendia. Foi um momento muito difícil. Hoje isso se repete, mas a gente tem superado esses momentos de perseguição e ameaça. Mas é a nossa luta. Isso une ainda mais a gente”.
Na educação suruí, Neidinha conta que os filhos são educados para cuidar dos pais quando eles ficam mais velhos. Na condição de ativista, a mãe explica que dá trabalho à filha.
"Eu sempre estou em situações de perigo e ela sempre chama a minha atenção e pede para eu ter cuidado. É bem cultural dos suruís de que os pai, com a idade, viram filhos. Isso é ótimo, porque tem coisas que ela vê e eu não consigo".
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