Rei respondeu à CBD, então regente do futebol brasileiro, que não poderia iludir o povo que o prestigiou em sua despedida da “Amarelinha” três anos antes no Maracanã Um pedido formal da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), então entidade máxima do futebol, para que Pelé voltasse atrás em sua decisão de não defender mais a seleção brasileira e participasse da Copa do Mundo de 1974, na Alemanha, foi recusado pelo então ainda jogador do Santos.
Em carta publicada pelos jornais do país no dia 22 de fevereiro daquele ano, o Rei do futebol frisou estar lisonjeado, porém disse não, agradecendo aos dirigentes e se mostrando honrado com o convite. Pelé morreu nesta quinta-feira, em São Paulo, aos 82 anos.
No texto, Pelé destacou que a decisão de não disputar mais jogos pela Seleção era irrevogável, acrescentando que, caso aceitasse, estaria iludindo os torcedores brasileiros, que prestigiaram em peso seu último ato com a Amarelinha, em amistoso contra a Iugoslávia, dia 18 de julho de 1971, no Maracanã.
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Pelé na sua despedida, no Maracanã, em 1971
Arquivo / O Globo
O duelo terminou empatado por 2 a 2, com Rivellino e Gérson anotando os gols brasileiros diante de um público de 138.575 pagantes. Após o término do primeiro tempo, o 10 eterno retirou sua gloriosa camisa, abraçou os companheiros e desceu pelo túnel central. Em seguida, retornou ao gramado e, emocionado, deu a volta olímpica, sendo ovacionado pelo povo, que acenava lenços brancos e gritava o nome que ficou imortalizado: Pelé.
E o Rei fez muita falta na Alemanha. Sem o craque (campeão em 1958, 1962 e em 1970), a Seleção decepcionou. Depois de empatar sem gols com os iugoslavos na estreia e em seguida com a Escócia, o time comandado por Zagallo precisava vencer a limitadíssima e ingênua seleção do Zaire por no mínimo três gols de diferença para passar de fase, e só conseguiu carimbar o passaporte graças a um frango de Mwamba Kasadi, goleiro do quadro africano, a 11 minutos do fim.
Na etapa seguinte, o Brasil bateu a Alemanha Oriental por 1 a 0 e a Argentina por 2 a 1, mas acabou alijado do título ao ser superado pela sensação Holanda por 2 a 0. Sobrando o consolo de disputar o terceiro lugar com os poloneses, a Seleção conheceu outra derrota, agora por 1 a 0, e deu adeus ao Mundial com um melancólico quarto lugar.
Carta de Pelé à CBD reproduzida em fevereiro de 1974 pelo Jornal do Brasil
Reprodução
Veja na íntegra a carta de Pelé à CBD:
“Recebi, com orgulho, o ofício de V. Sas, através do qual me é feito o pedido para que volte a defender nossa querida Seleção Brasileira de futebol, à qual prestei meu concurso, por espaço de tempo à metade de minha existência.
O pedido de V. Sas representa o maior prêmio de minha vida, pois nela está consubstanciado o reconhecimento da entidade máxima do futebol brasileiro, pelos meus 16 anos de trabalho.
Sempre procurei trabalhar com dedicação e honestidade, dando o que de melhor ao meu trabalho e ao Brasil. Recusei todas as vultosas propostas para jogar no exterior, pensando neste povo que sempre me incentivou.
A decisão por mim tomada, em 1971, contou com a concordância de Vsas, de quem recebi todas as homenagens, inclusive o prêmio dado a todos os jogadores que se despedem, o que jamais se apagará de minha lembrança.
O povo, irmanado com a CBD, prestigiou a minha despedida e eu não poderia, agora, iludir este mesmo povo e meus próprios colegas que tanto me ajudaram.
Em 1958 vários jogadores, inclusive eu, surgiram para defender nossa Seleção. Está na hora de unirmos esforços para que surjam outros, nas mesmas condições, para que consigam trazer, definitivamente, a Taça que hora se inicia, como já foi feito com a Jules Rimet.
É chegado o momento de mostrar aos brasileiros que posso ser útil ao país em outros campos de atividade, com a mesma dedicação, honestidade e motivação com que sempre defendi a nossa Seleção.
Contando com a compreensão de V. Sas,
Cordialmente”
Nota: No texto reproduzido na época pelo Jornal do Brasil, houve um erro de digitação quando Pelé se refere ao surgimento de vários jogadores, inclusive ele. O ano de sua primeira Copa é 1958 (como impresso corretamente nos demais jornais) e não 1966.