Equipe de Buenos Aires será palco da estreia do Verdão na Libertadores de 2024, com duelo marcado para às 21h30 desta quarta-feira, no estádio Nuevo Gasómetro Elenco do Palmeiras chega a Buenos Aires para estreia na Conmebol Libertadores
Sete dígitos em sequência marcam uma relíquia guardada como ouro entre os documentos do San Lorenzo, na cidade de Buenos Aires, na Argentina: 88235N-0. São a identificação de um sócio, agora aos 87 anos de idade, dono do rosto pintado entre muros ao redor do clube.
É Jorge Mario Bergoglio. Ou, como tornou-se conhecido, o Papa Francisco.
É um homem humilde, de pouca exigência. Não pede nada ao San Lorenzo e desde 2008, segundo o clube, paga religiosamente as parcelas de sua carteirinha de sócio.
– Ele é muito querido pelas pessoas da instituição, sempre elogia o San Lorenzo, e os torcedores gostam muito dele.
Carteirinha de sócio do Papa Francisco no San Lorenzo
San Lorenzo
Mais célebre torcedor da história do clube, Bergoglio deu novo apelido - como Time do Papa - e impulsionou o San Lorenzo com sócios, notoriedade e alcance mundial ao longo dos últimos anos. Transformou-se naquilo que a imprensa argentina batizou de "O efeito Francisco".
O San Lorenzo será o adversário do Palmeiras às 21h30 (de Brasília) desta quarta-feira, em Buenos Aires, pela rodada da estreia da Conmebol Libertadores.
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Quando ainda Jorge, décadas antes do Vaticano, Bergoglio cresceu filho de um casal de italianos, Mario, ex-funcionário ferroviário, e Regina, dona de casa. Nasceu na Argentina, criado no bairro de Flores, depois da família fugir da Itália durante o regime fascista de Benito Mussolini. E entre cinco irmãos, viu o futebol entranhar-se em sua história.
– Ser do San Lorenzo é parte da minha identidade cultural.
Jorge Mario (quarto menino, na terceira fila) quando estudava no Colégio Salesiano de Buenos Aires, na década de 40
Acervo / San Lorenzo
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Jorge jogava bola na Praça Herminia Brumana quando criança e transformava bancos em gols, a poucos metros de casa e dos ídolos da infância. O pai treinava basquete no San Lorenzo, e a rotina da família Bergoglio nos fins de semana começava na casa da avó, ouvindo ópera, e terminava entre as arquibancadas do El Gasómetro, antigo estádio do clube, para ver o time jogar.
– San Lorenzo era a equipe da família. Meu pai jogava na equipe de basquete e desde pequeno, minha mãe também vinha conosco ao Gasómetro.
Vista do antigo estádio Gasómetro, em 1950, antes de ser demolido
Acervo / San Lorenzo
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O então menino tinha 10 anos quando assistiu à equipe conquistar o Campeonato Argentino de 1946, abraçada por um mar de torcedores na invasão ao gramado e quebrando um jejum de uma década. Era o time comandado pelo Terceto de Ouro, formado por Pontoni, Armando Ferro e Rinaldo Fioramonte Martino.
Jorge guardou essa escalação consigo na memória, assim como uma camisa do San Lorenzo, uma foto do Viejo Gasómetro e um pedaço da arquibancada do antigo estádio.
Os vestígios dessa relação, por sua vez, estão marcados em pinturas, bandeiras e até mesmo em celebrações nos arredores do bairro de Boedo, onde está a sede do clube.
Papa Francisco pintado entre as paredes próximas à sede do San Lorenzo, em Buenos Aires
Eduardo Moura/GloboEsporte.com
O pontífice, quando arcebispo de Buenos Aires, costumava celebrar missas nas igrejas mais populares do bairro. Todo 1º abril, aniversário de fundação do clube, oficiava a cerimônia na capela do San Lorenzo e dois anos antes de ir ao Vaticano, em 2011, abençoou a Capela Padre Lorenzo Massa, criada em homenagem a um dos seus fundadores.
– Lembro dele pela sua humildade. Ele não queria que fôssemos buscá-lo para dar a missa. Decidiu vir de metrô.
Mural pintado pelo grupo artístico de Boedo em homenagem ao Padre Lorenzo Massa
Acervo
Jorge virou Papa Francisco em 2013, chamado para o Vaticano após Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI, renunciar ao posto.
Naquele momento, o San Lorenzo estava em processo de recuperação de uma das crises mais profundas dos últimos anos, com uma dívida em cerca de 20 milhões de dólares, e começava mais uma temporada brigando contra o rebaixamento.
Eram os primeiros capítulos do "efeito Francisco".
San Lorenzo, time do Papa Francisco, vence a Taça Libertadores da América
Desde que tornou pública a paixão pelo clube, o San Lorenzo multiplicou seu número de sócios, saltando de 15 mil para 60 mil no intervalo de um ano e agora em cerca de 80 mil pessoas, até este início de 2024. Ao mesmo tempo, cresceu a nível internacional, sendo convidado a amistosos contra Paris Saint-Germain e Athletic Bilbao, por exemplo, na Europa.
– O San Lorenzo tem nível internacional desde 1946, quando fez a gloriosa tour pela Espanha, mas Bergoglio foi muito importante para a fama do clube fora do país.
Papa Francisco camisa San Lorenzo
Agência Reuters
Dez meses depois da nomeação do Papa, o San Lorenzo conquistou o Torneio Início do futebol argentino interrompendo uma espera de quase seis anos sem levantar troféus.
Em 2014, sob o comando do técnico Edgardo Bauza, derrubou Grêmio, Cruzeiro, Bolívar e Nacional, do Paraguai, para sagrar-se campeão da Libertadores pela primeira vez na história. Era o fim das provocações aos Corvos, último dos cinco grandes da Argentina a ostentar o feito.
– Rezamos muito para conquistar o título. O Papa trabalhou muito também e por isso fomos agradecê-lo e trazer-lhe a Copa – contou o ex-jogador e diretor esportivo do time, Bernardo Romeo, à revista El Grafico, em 2014.
Bergoglio, portanto, virou Papa para um ano depois ver o San Lorenzo conquistar a América.
Papa Francisco recebe San Lorenzo no Vaticano
Quase nove décadas depois da infância, as marcas de Jorge estão presentes nas ruas de Boedo - ainda que o antigo estádio, demolido na década de 80, não mais esteja.
Faz manter viva a história, separada agora por mais de 11 mil km, do filho de emigrante, padre e a paixão latente pelo futebol. Registrada em carta, como ele mesmo escreveu, em março de 2013, ao então presidente.
– Ao ler suas palavras, veio à minha memória belas recordações da minha infância. Segui, aos 10 anos, a gloriosa campanha de 46: Aquele gol de Pontoni! Saiba que não os esqueço.
Papa Francisco camisa San Lorenzo
Agência AP
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